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Entrevista: «Esclerose Lateral Amiotrófica – é preciso ajudar a fazer o luto deste diagnóstico », Marta Pinto, terapeuta da fala da Associação Portuguesa de Esclerose Lateral Amiotrófica

No apoio prestado aos doentes com Esclerose Lateral Amiotrófica, os terapeutas da fala concentram-se em áreas fundamentais como a deglutição, a fala e a comunicação.

21 Novembro 2023
Sandra M. Pinto

Cada pessoa com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é única, e as suas necessidades de comunicação e apoio podem variar. O essencial é que as famílias e/ou cuidadores demonstrem compreensão, empatia e estejam dispostos a adaptar-se às necessidades individuais do doente à medida que a doença progride ao longo do tempo, refere Marta Pinto, Terapeuta da Fala da Associação Portuguesa de Esclerose Lateral Amiotrófica (APELA) de Lisboa.

No apoio prestado aos doentes com Esclerose Lateral Amiotrófica, os terapeutas da fala concentram-se em áreas fundamentais como a deglutição, a fala e a comunicação. Como explica à forever Young esta especialista, «a terapia da fala evoluiu ao longo do tempo para atender às necessidades específicas das pessoas que enfrentam a Esclerose Lateral Amiotrófica».
O que é a Esclerose Lateral Amiotrófica?
É uma doença neurológica degenerativa, progressiva e rara, sendo a forma mais frequente de doença do Neurónio Motor (DNM), na qual os neurónios motores que conduzem a informação do cérebro aos músculos do nosso corpo, passando pela medula espinhal, morrem precocemente.

Quais os sintomas da doença?
Na ELA os sintomas poderão depender da forma de apresentação inicial, mas alguns destes são fraqueza muscular, atrofia muscular, fadiga e cãibras. Poderão também acontecer alterações de fala e de deglutição.

De que forma se faz o diagnóstico?
O diagnóstico é feito pelo médico neurologista através de uma bateria de exames, nomeadamente, uma eletromiografia.

Que consequências tem a doença na vida dos doentes?
A ELA tem uma consequência devastadora na vida dos doentes e da sua família, com uma progressão de perda das funções motoras relacionadas com os braços e as pernas, dificuldades de respiração e tosse, bem como perda na função de comunicar e de se alimentarem de forma independente e segura.

Há uma efetiva diminuição da qualidade de vida dos doentes?
A pessoa com ELA vê-se cada vez mais dependente dos outros para realizar as tarefas do dia-a-dia que para outros seriam simples. A maioria das pessoas passa a estar dependente de alguém para tudo, deixando para trás os seus postos de trabalho, as relações sociais e muitas das vezes os seus sonhos e planos para o futuro.

De que forma a Esclerose Lateral Amiotrófica afeta a fala e a deglutição?
Uma das forma de apresentação da ELA é a forma bulbar, onde os músculos afetados são os responsáveis pela fala e pela deglutição. Aquando do diagnóstico, a pessoa com ELA bulbar terá em média aproximadamente um ano até a sua fala deixar de ser inteligível para comunicar as suas necessidades. Da mesma forma, vai apresentando sintomas de alterações de mastigação e deglutição que irão comprometer a eficácia e a segurança da deglutição, necessitando de adotar estratégias posturais durante a alimentação, alteração das consistências e outros.

Como é que os terapeutas da fala podem ajudar?
O terapeuta da fala é o responsável pela avaliação e intervenção nas áreas da fala, deglutição e comunicação. Poderá ensinar estratégias para a fala, deglutição e iniciar precocemente o aconselhamento e treino de sistemas aumentativos de comunicação.

Qual é a importância da intervenção precoce?
Uma intervenção precoce do terapeuta da fala permite, essencialmente, assegurar o estado nutricional e hídrico da pessoa com ELA, fazendo a ponte atempadamente com outros profissionais, como o nutricionista. Irá também permitir iniciar atempadamente o treino de sistemas aumentativos de comunicação visto que cerca de 90% das pessoas com ELA, em algum momento da sua doença, não conseguirão comunicar eficazmente através da fala, e comunicar é um direito e deverá ser assegurado o mais cedo possível.

Na deglutição quais os riscos para o doente e que estratégias pode o terapeuta implementar para os minimizar?
Uma pessoa com ELA com alterações de deglutição poderá ver comprometido o seu sistema respiratório e o aporte hídrico e nutricional. Desta forma, o terapeuta da fala poderá monitorizar a evolução do quadro, ensinando e treinando estratégias e manobras compensatórias com o objetivo de minimizar as consequências referidas, contribuindo assim para a qualidade de vida da pessoa.

Ao nível da fala, de que forma podem estes profissionais ajudar os doentes e de quem deles cuida?
O terapeuta da fala poderá ensinar estratégias de poupança de energia para a fala (uso de amplificadores de fala, treino de palavras chave, entre outros) bem como treinar os parceiros comunicativos. Poderá também encaminhar precocemente para a gravação de voz e para iniciar um banco de mensagens, gravações essas que poderão ser no futuro colocadas no sistema de comunicação que a pessoa vier a utilizar.

O que são os dispositivos de Comunicação Alternativa e Aumentativa (CAA)?
A CAA serve para compensar, de forma temporária ou permanente, as limitações nas atividades e as restrições da participação da pessoa com alterações na comunicação e implica o uso de formas multimodais para ultrapassar as limitações. Recorrentemente as pessoas com ELA acabam por utilizar sistemas integrados de CAA onde através de um computador e controlo ocular, conseguem manter a sua comunicação de vários modos e de forma totalmente independente, permitindo-lhes manter o seu papel familiar, nas redes sociais e nas suas decisões clinicas.

Podemos afirmar que a tecnologia é uma boa aliada?
Atualmente, a tecnologia contribui de forma muito positiva: a pessoa com ela pode ter a sua voz previamente gravada agora sintetizada e colocada no seu sistema de comunicação, tornando-o uma extensão de si. Poderá ainda manter-se ativa e independente no uso de um computador, acesso a telemóvel, redes sociais e outros. Há algumas pessoas que, mesmo em estado avançado, mantêm os seus negócios e trabalham recorrendo à tecnologia e softwares atuais disponíveis e adaptados à pessoa com ELA.

Quais os maiores desafios (e dificuldades) que se colocam aos cuidadores destes doentes?
Os maiores desafios e dificuldades são o aceitar a doença, saber onde procurar informação correta e especializada, e o conseguir acompanhar o seu familiar ou amigo nesta dura caminhada. Há um enorme reajuste em diversas áreas como familiar, social e financeira.

É importante ajudá-los a ultrapassar cada um deles?
Sim, por um lado é importante permitir que cada um trace o seu caminho sabendo que, se necessário, terá sempre uma equipa multidisciplinar ao seu lado para ajudar a tomar decisões informadas e a fazer o luto deste tipo de diagnóstico.

A Esclerose Lateral Amiotrófica não tem cura, correto?
A ELA é uma doença neurodegenerativas, progressiva e, atualmente, sem cura.

E a doença progride ao longo do tempo?
Sim, é uma doença progressiva sendo a principal causa de morte a insuficiência respiratória, sendo que a sobrevida média documentada de cerca de 5 anos (havendo algumas situações atípicas de progressão mais lenta).

Perante isso, compreensão, empatia e adaptação por parte dos cuidadores é essencial?
Sem dúvida, os obstáculos da pessoa com ELA e dos seus cuidadores, formais e informais, são diários e vão aumentado ao longo do tempo. Quando se habituaram a uma perda aparece outra e há uma dura necessidade contínua de adaptação.

 

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