“Há uma discussão que a sociedade portuguesa tem de ter: o abandono dos idosos pelas famílias. Na minha própria unidade, em Sintra, fiquei surpreendido, porque, num total de 59 utentes afetos à Rede Nacional de Cuidados Continuados, 27 – quase 50% – são abandonados pelas famílias. Isto lança uma grande pressão no sistema, nomeadamente a nível hospitalar, daí que o número de casos sociais esteja a aumentar”, afirma José Bourdain à agência Lusa.
Numa reação aos dados da 8.ª edição do Barómetro dos Internamentos Sociais (BIS), que revelaram que até 20 de março existiam 2.164 camas ocupadas no Serviço Nacional de Saúde (SNS) com internamentos sociais – mais 11% face ao mesmo período de 2023, com um custo de mais de 68 milhões de euros para o Estado -, o líder da ANCC sublinha também um problema de “subfinanciamento” e alerta para o encerramento de camas.
“O Governo não paga os valores que são devidos: o salário mínimo aumenta, os custos aumentam com a inflação, mas, depois, nas verbas correspondentes o Governo não nos dá essa receita e o facto é que nos últimos três anos fecharam 307 camas em cuidados continuados e há várias unidades à beira de fechar, completamente desesperadas. Isto retirou do sistema mais 307 camas até ao final do ano passado”, realça.
José Bourdain assegura não ter ficado surpreendido com os dados do BIS, que justificou o aumento dos internamentos sociais com atrasos na admissão para a Rede Nacional de Cuidados Continuados (RNCCI) e para Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas (ERPI), mas lembra que não é só nos hospitais públicos que se faz sentir esse peso.
“Nos próprios cuidados continuados há cerca de 37% de casos sociais. Se nos hospitais são 11%, nos cuidados continuados são 37%… se estas pessoas saíssem dos cuidados continuados, porque também já tiveram alta clínica e alta social, imediatamente abriam-se vagas para estes [quase] 2.200 casos de internamentos sociais que há nos hospitais”, acrescenta.
O presidente da ANCC destaca ainda que um aumento do investimento do Governo no pagamento aos cuidados continuados, aos lares de idosos e ao apoio domiciliário “compensa largamente” a despesa atual face a este fenómeno e aponta soluções a curto e a médio prazo.
“Uma forma imediata para ajudar a resolver o problema, porque é a forma mais rápida e barata, é criar vagas em apoio domiciliário. Só por isso vamos ajudar a libertar algumas centenas de camas dos hospitais e já vale a pena. Depois, porque vai demorar mais tempo, é criar mais vagas em lares de idosos e em cuidados continuados, pois só assim resolvemos o problema dos casos sociais nos hospitais e nos cuidados continuados”, conclui.
O BIS foi apresentado hoje no Centro de Reabilitação do Norte, em Valadares, e foi realizado pela Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), em parceria com a consultora EY Portugal e com o apoio institucional da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna e da Associação dos Profissionais de Serviço Social.
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