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Equipa de cientistas portugueses dá mais um passo sobre como o cérebro codifica o que é bom ou mau

Uma equipa da Universidade do Minho descobriu que dois grupos de neurónios, os D1 e D2, que se pensava trabalharem como rivais, tendem a trabalhar juntos perante estímulos bons ou maus.

16 Janeiro 2025
Sandra M. Pinto

O estudo saiu na conhecida revista Nature Communications e ajuda a perceber melhor o sistema de recompensa, que está disfuncional em doenças como a depressão e adição de substâncias.

A pesquisa foi coordenada por Ana João Rodrigues e Carina Cunha, no Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) da Escola de Medicina da UMinho, tendo a parceria dos colegas Rui Costa e Gabriela Martins, da Universidade de Columbia e do Allen Institute (EUA). O trabalho foi cofinanciado pelo Conselho Europeu de Investigação, pela Fundação la Caixa, pela Fundação Bial e pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

Os neurónios D1 e D2 situam-se no núcleo accumbens, no interior do cérebro, que apresenta alterações em algumas condições neuropsiquiátricas. Estes neurónios fazem parte do circuito da recompensa, essencial na sobrevivência das espécies, como quando nos esforçamos pelo que necessitamos e desejamos, desde comida, música ou sexo. A equipa da UMinho tinha já provado em ratinhos que ambos os grupos de neurónios não são necessariamente rivais a processar estímulos negativos e positivos, pois os D2 também processam estímulos positivos ou de prazer.

Desta vez, os cientistas foram mais minuciosos e usaram microscópios miniaturizados para seguir centenas destes neurónios em tempo real em roedores expostos a estímulos apetitivos e aversivos. Demonstrou-se pela primeira vez que os D1 e D2 responderam em conjunto a ambos os estímulos. De seguida, procurou-se compreender como é que estes neurónios respondiam durante a aprendizagem de associações positivas e negativas, similares à famosa experiência do cientista Ivan Pavlov que condicionou cães a salivar por comida assim que ouviam uma campainha. Neste caso, os cientistas treinaram os animais para associar um som específico com a entrega de uma recompensa ou um estímulo aversivo. Com surpresa, os D1 e D2 reagiram de forma similar ao longo da aprendizagem, não mudando drasticamente as taxas de resposta.

Como adaptar rápido à mudança?

No entanto, os investigadores alteraram as regras do jogo: o som já não era acompanhado de recompensa ou do estímulo aversivo. Com um laser de precisão nanométrica que “liga e desliga” neurónios específicos (optogenética), os cientistas mostraram que os D2 eram fundamentais na adaptação à mudança. Ou seja, quando inibiram os neurónios D2, os animais demoravam mais tempo a “compreender as novas regras do jogo”.

Desvendar como o cérebro codifica e responde a pistas externas que predizem algo positivo ou aversivo é crucial para compreender melhor doenças como stress pós-traumático ou depressão. A mesma pista externa pode desencadear respostas muito diferentes consoante o contexto do indivíduo e das memórias associadas. Por exemplo, o som de fogo-de-artifício remete para momentos festivos e divertidos, mas para um antigo militar pode gerar uma crise ansiosa, relembrando a guerra, mesmo que ele esteja em ambiente seguro. Esta capacidade de o cérebro resignificar estímulos externos com base em experiências passadas e ajustar-se a contextos revela a grande complexidade dos nossos circuitos neuronais neste tipo de memórias.

Este novo estudo demonstra assim a enorme relevância dos D1 e D2 na resposta a estímulos positivos ou negativos e nas pistas que predizem esses estímulos, diz Carina Cunha: “Apesar de em certos momentos terem atividade distinta, há muita similaridade entre estes grupos e isso foi algo inesperado, o que abre muitas portas para o futuro; aliás, dentro destes grupos percebemos que há uma segregação funcional, mas falta saber de onde vem e vamos procurar o que as diferencia, tanto em contexto fisiológico como em patologia”.

Ana João Rodrigues menciona que, na próxima fase do projeto, “pretende-se encontrar marcadores genéticos que identifiquem os neurónios que codificam algo positivo e aversivo, para perceber o que é que distingue estes subtipos de neurónios.” “Desta forma, podemos criar novas ferramentas para manipular estes neurónios e ver o seu impacto no comportamento”, conclui a investigadora Verónica Domingues. A equipa no ICVS incluiu ainda Tawan Carvalho, Raquel Correia, Bárbara Coimbra, Ricardo Bastos-Gonçalves, Marcelina Wezik, Rita Gaspar, Luísa Pinto e Nuno Sousa.

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