Adília Lopes é uma das poetisas mais reconhecidas da literatura portuguesa contemporânea, conhecida pela sua linguagem simples, mas profundamente emotiva e intensa. A sua obra é cheia de ironia, humor, e reflexões existenciais, e muitos consideram-na uma das maiores vozes da poesia portuguesa do século XXI.
A perda de Adília Lopes, no passado dia 30 de dezembro de 2024 é, sem dúvida, um grande lamento para a poesia portuguesa e para todos que se sentiram tocados pela sua escrita única e profunda. Não podemos deixar que a sua partida nos faça esquecer o que ela nos deu: um olhar atento ao que é verdadeiro, ao que é simples, e ao que é profundamente essencial em cada um de nós.
Adília foi uma poetisa cujas palavras atravessaram as barreiras do simples ato de escrever e se transformaram num reflexo da vida quotidiana, das suas incertezas e inseguranças e da sua complexidade. Ela foi uma verdadeira mestre em captar o mundano e transformá-lo em poesia, tratando de temas como o amor, a solidão, o desejo, a liberdade e a identidade com uma honestidade brutal e, ao mesmo tempo, com uma leveza surpreendente.
Adília não se contentava com o óbvio. Ela questionava tudo e todos, desafiando normas e convenções. Ela não era só uma poetisa, mas uma voz rebelde e livre, que falava de igual para igual com o leitor, sem esconder a sua visão do mundo cheia de contrastes e contradições.
Hoje, a poesia de Adília Lopes vive em cada linha que escreveu, em cada verso que nos deixou. A sua voz, que desafiava e acolhia, continua a ressoar em todos os que se entregam às suas palavras. A melhor homenagem à sua memória é continuar a ler o que escreveu e tornar as suas palavras parte da nossa vida.
Excerto do poema do livro Estar em casa (2018):
“Só gosto das pessoas boas
Quero lá saber que sejam inteligentes artistas sexy
Sei lá o quê
Se não são boas pessoas
Não prestam”
Este poema é uma das declarações mais fortes de Adília Lopes sobre os valores humanos. Reflete uma visão simples, mas profunda, de que a bondade e a sinceridade são os pilares essenciais para se relacionar com o outro independentemente de outras qualidades como inteligência ou aparência. Adília tem esta forma de abordar temas profundos de maneira direta e sem rodeios, o que torna a sua poesia ainda mais poderosa e autêntica.
A poesia de Adília muitas vezes critica o superficial e o material, destacando que o que realmente importa é o caráter e a humanidade das pessoas.
“A minha gata Lu
Era mansa meiga bondosa macia
Minha filha e minha mãe”
“A minha gata Lu morreu
Está sempre viva
Mas agora não lhe posso
Dar festinhas”
é um dos poemas mais emblemáticos de Adília Lopes, e é encantador. Nele, a autora fala da sua gata com uma ternura e sinceridade que se tornam universais. O poema vai além de uma simples descrição de um animal de estimação, trazendo à tona sentimentos de afeto, companheirismo e até de reflexões sobre a liberdade e o amor.
Esta obra reflete o vasto e profundo universo poético de Adília, revelando a sua sensibilidade e coragem para abordar temas universais. Ao revisitar a sua poesia, encontramos uma voz de resistência, sinceridade e autenticidade.
É uma verdadeira homenagem à sua trajetória, oferecendo uma visão do seu olhar atento sobre o mundo. Ao ler DOBRA, somos convidados a explorar as múltiplas camadas da vida, conectando-nos com a simplicidade e a beleza do que é genuíno. DOBRA de Adília Lopes da Assírio & Alvim
*Assírio & Alvim é uma chancela da Porto Editora