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Alienação Parental: «Para que não fiquemos nós alienados, a importância de ouvir e ver bem», Patrícia Câmara, psicóloga/psicanalista

Artigo de opinião de Patrícia Câmara, psicóloga/psicanalista e Presidente da Sociedade Portuguesa de Psicossomática

25 Abril 2025
Patrícia Câmara, psicóloga/psicanalista e Presidente da Sociedade Portuguesa de Psicossomática

A importância de um trabalho interior sério é inequívoca a vida toda, mas será certamente essencial, em momentos de separação ou divórcio, para garantir a menor contaminação possível da relação com os filhos. Os problemas relacionais que se teve com a pessoa com quem se viveu a relação, são muitas vezes colocados, ainda que maioritariamente de forma involuntária, nos filhos e filhas.

Atribuições múltiplas aparecem em frases que violentam as crianças e jovens por obrigarem a alianças internas difíceis e/ou impossíveis. Coisas aparentemente inofensivas, mas ditas com carácter pejorativo como: “nisso não sais mesmo nada a mim, és igualzinha à tua mãe” têm um impacto interno de amplitude variável, mas sempre negativa. Sabemos que este tipo de afirmações acontece mesmo quando os casais estão juntos e não podemos menosprezar a insidiosa humilhação que vai sendo feita ao outro membro do casal através dos filhos que acaba por humilhar o próprio filho e a relação que tem com ambos os cuidadores.

Os conflitos parentais acabam sempre por atingir as crianças e os jovens e as dinâmicas estabelecidas entre todas as pessoas que constituem as famílias, as anteriores e as novas. Um ambiente ideal seria aquele em que os conflitos pudessem ser entendidos numa impossibilidade de vida íntima em conjunto, mas numa possibilidade de aceitação daquilo que é a personalidade do outro. Claro que nunca em situação de violência pontual ou reiterada. Nesse caso, será importante saber que a violência sob todas as suas formas, como o é, por exemplo, o ataque ao carácter, não pode ser consentida.

As dinâmicas existentes mesmo antes dos processos de separação e divórcio, condicionam a própria forma como estes vão decorrer e o impacto que vão ter na

regulação das responsabilidades parentais. Se a criança ou jovem for instrumentalizada numa luta entre dois territórios que se recusam a construir um terreno comum a meio, a relação com os pais ou mães será pautada pela ausência de reconhecimento dos seus filhos e filhas como seres singulares e o seu bom desenvolvimento ficará à mingua do que poderia ser, sendo o sofrimento psicológico vivenciado maior do que numa primeira análise poderíamos constatar.

A escalada de conflito entre os membros do ex-casal pode ser geradora de movimentos cada vez menos saudáveis e mais intempestivos que polarizam a relação e a mente dos próprios filhos e filhas. “Como posso gostar tanto da minha mãe, quando o meu pai me diz que ela me quer afastar dele?”. Estas e outras questões igualmente malignas circulam sem resposta e provocam movimentos internos pautados por escolhas complicadas a que as crianças e jovens não deveriam estar sujeitas. A importância de apoio psicológico em situação de conflito poderia contribuir para uma maior elaboração das dificuldades encontradas ao longo da relação e assim proteger os filhos das zangas, mal-entendidos e vivências complicadas que ficaram por pensar. Tudo o que não resolvemos verdadeiramente dentro de nós é passível de ser agido na relação com os outros de forma muito pouco construtiva e a relação com os filhos é, lamentavelmente, palco de muitas destas situações.

Contudo, nem sempre a questão do conflito se encontra em mutualidade e existem casos em que há mesmo uma instrumentalização ou tentativa de instrumentalização séria dos filhos por um dos pais tendo em vista a desvalorização ou rutura total com o outro, pela manipulação e exercício de poder e ameaças mais ou menos explícitas. Existe alguma tendência para se ir buscar o conceito de alienação parental ou síndrome de alienação parental para evocar estas situações, contudo este conceito não é consensual na comunidade científica e pode, se não se tiver cuidado, ser utilizado para reiterar consentidamente um ato de violência relacional, como o silenciamento das próprias crianças e jovens naquilo que é a possibilidade de exporem a sua vontade. Assim, falar em manipulação e terror psíquico parece ser um caminho mais respeitante da complexidade do que é vivenciado.

Alguns mitos podem também comprometer a leitura dos acontecimentos e do que efetivamente se está a passar, como o da proximidade. A ideia de que a pessoa mais próxima será aquela que mais facilmente incorre com sucesso no ato de manipulação dos filhos é perigosa e iliba a idealização frequente do pai ou mãe que está longe. Sabemos que é mais fácil discutir com quem existe, do que com quem existe pouco. O medo de perder o tão pouco que se tem, faz com que muitas vezes, o pai ou a mãe com quem se tem uma relação mais frágil, seja idealizado. Pelo que, por exemplo, no caso das vítimas de violência doméstica pode conduzir, facilmente a um erro de avaliação das competências parentais. A manipulação pode entrar exatamente por aqui, pelo medo que os filhos podem ter de perder ou pôr em causa o pai ou a mãe que agrediu e que habitualmente tem uma atitude sedutora e de indutora de ataque ao outro progenitor.

Normalmente o pai ou mãe que tende a manipular e a causar sensações de ódio associadas ao outro pai ou mãe, não o faz de forma visível para a maior parte das pessoas à volta, pelo contrário, habitualmente o ataque é velado ou acontece à porta fechada. A manipulação sob todas as suas formas é uma agressão e assenta no jogo de domínio e submissão a que a própria condição de ser filho não é imune. Quem manipula usa do seu lugar hierárquico para causar dano, e coloca-se como alternativa única para sarar o dano que o próprio causou. Por outras palavras, o tempo passado com quem manipula é todo ele intoxicado por sensações de medo e amparo que boicotam a capacidade de pensar. Tal como acontece na maioria das agressões, quem agride convence a vítima que as agressões vêm de outro lugar e que é ele mesmo quem pode manter a vítima a salvo. A pouco e pouco, pelo terror que se vai instalando dentro da criança ou jovem a força de quem agride vai ganhando terreno e pode ir criando uma aliança interna que impede a criança ou jovem de se lembrar da relação que tem com o outro pai ou mãe, conduzindo a uma incapacidade de ver para além daquilo que quem agride diz ser a verdade.

Gerir uma situação destas é muito desgastante e acarreta muito sofrimento para o pai ou mãe que está a ver o seu filho ser anulado pelo agressor. Não é apenas a relação com o pai ou mãe que está ser impossibilitada, o que em si mesmo já seria tremendo, mas também a relação do filho consigo próprio. É importante saber que

se sentimos que os filhos estão a deixar de nos ver temos de sermos fiéis a nós próprios na relação com eles e aumentar a nossa capacidade de resposta. Podemos mostrar que lamentamos que se estejam, por exemplo, a dizer coisas sobre nós que põem em causa a liberdade da relação deles connosco. Dizer também que imaginamos que seja muito difícil para eles ouvir coisas sobre nós e que isso os deve deixar confusos. Mas que o mais importante é não se esqueçam das coisas que viveram e vivem connosco porque essas são as que realmente importam. Não cair em tentação de jogar o jogo de quem está a querer instrumentalizar é ponto de partida para garantir que os filhos são capazes de se escutar a si próprios para além da manipulação de que estão a ser alvos!

Se todos soubermos da importância de um olhar de complexidade sobre estas temáticas, bem como da necessidade de um maior conhecimento interior sobre as dinâmicas que transportamos seremos, com certeza, menos passíveis de ser “alienados” ou de “alienar”! A psicoterapia, a psicanálise são boas ferramentas de fundo a utilizar.

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