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Opinião: O luto parental – a aceitação da nova condição de pais

Artigo de Catarina Lucas, psicóloga

15 Maio 2023
Sandra M. Pinto

A família quer-se unida e feliz. Porém, a vida nem sempre corre como planeado e o inesperado pode virar a vida de cada um do avesso.

Por Catarina Lucas, psicóloga

A morte de um filho é uma cicatriz que fica para a vida. Quer tenha sido durante a fase de gravidez, em pequeno ou mais velho, este é provavelmente um dos acontecimentos mais dolorosos que o ser humano poderá enfrentar.

A intensa vinculação afetiva criada entre pais e filhos leva a que o desaparecimento destes últimos acabe com o equilíbrio emocional das figuras parentais e desestabilize a própria idealização de felicidade e realização humana.

O luto é uma reação automática e natural face a uma perda, onde é impossível fazer algo com o que acontece, apenas lidar com os sentimentos que a mesma provoca. A pessoa enlutada passará pelo processo de tentar ultrapassar o acontecimento, e, para isso, experienciará um turbilhão de emoções em cada fase.

As fases conhecidas de um processo de luto são a negação, a revolta, a negociação, a depressão e, por fim, a aceitação.

A negação é um dos primeiros sentimentos pelos quais os pais enlutados passam, trata-se de uma resposta instintiva à dor e ao choque da perda, onde negam a existência do problema. Quando começam a perceber a realidade e se sentem injustiçados, segue-se a revolta, uma emoção geralmente direcionada ao cônjuge, familiares e amigos, e que pode trazer um mal-estar às relações sociais.

Na fase de negociação, a pessoa negoceia consigo ou com uma qualquer entidade superior (eg. Deus) na tentativa de aliviar a dor ou repor aquilo que perdeu. A fase da depressão carateriza o momento em que a figura parental realmente sente o peso da ausência e, por isso, experimenta apatia e desinteresse pela vida e pelas atividades diárias. É confrontada com a irremediabilidade da situação.

O fator-chave no processo de luto é a aceitação, à qual nem todos os pais enlutados conseguem ou querem chegar. Nesta fase, a pessoa começa a adaptar-se à nova realidade sem a presença do(a) filho(a). Nunca se tratará de esquecer ou superar a perda, apenas de aprender a viver com ela.

A vida será sempre diferente, mas com certas estratégias internas é possível encontrar a resiliência para seguir em frente.

Sentir e aceitar as emoções. A intensidade das emoções que se sente quando se perde um(a) filho(a) é grande, pelo que é importante deixar o corpo vivenciar a inevitável dor, bem como todos os outros sentimentos que possam eventualmente surgir.

Cuidar do próprio bem-estar. Manter hábitos saudáveis é fundamental para enfrentar o luto e não entrar num ciclo vicioso que poderá desestabilizar o próprio dia a dia.

Ser paciente. A aceitação é um processo contínuo que leva tempo e que muda de pessoa para pessoa, assim como a recuperação não é linear, pelo que a paciência é algo a ser praticado.

Procurar ajuda profissional. Partilhar a experiência e desabafar com um profissional servirá para aliviar a carga emocional, principalmente quando a dor se tornar insuportável. Trabalhar a perda permitirá aceitar cada vez mais o que aconteceu.

Recordar o filho nas suas coisas positivas. É importante evitar o isolamento e não deixar de falar do(a) filho(a). Recordar que ele(a) existiu e existe nas suas vidas é fundamental.

Cada período de luto é uma experiência individual, onde a duração e a dificuldade de cada processo varia de acordo com vários fatores, uma vez que cada indivíduo possui mecanismos internos diferentes. Assim, tanto o pai como a mãe vivem diferentes processos de superação da dor.

E se as estratégias adaptativas de cada um estiverem eventualmente enfraquecidas, por fatores internos e/ou externos, o luto pode tornar-se incapacitante. Nestes casos, é urgente a procura de ajuda externa para que a figura parental, que não consegue dar sentido à vida, não desenvolva esquemas de comportamento desadaptativos que gerem ainda mais sofrimento e prejudiquem também a relação futura com o cônjuge.

O ser humano está programado para se separar sem se destruturar, uma reação para lidar com as separações no quadro dos vínculos afetivos que é auxiliada por mecanismos pessoais, familiares, sociais e culturais no sentido de superar a perda. No entanto, a dor pela perda de um filho é das mais significativas dores que o ser humano pode experienciar. Um luto que se entende longo e difícil de se fazer, onde a ajuda parece ser sempre insuficiente.

Não se trata de ultrapassar a morte do(a) filho(a) – até porque este(a) nunca deixará de ocupar o espaço afetivo na memória dos pais -, antes aprender a viver com a sua perda e ausência.

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