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Acidente vascular cerebral: «A cada minuto sem tratamento podem morrer até 4 milhões de neurónios», Luís Fontão, neurologista

O acidente vascular cerebral (AVC) é a principal causa de morte em Portugal. Em todo o mundo, estima-se que: uma em cada seis pessoas terá um AVC; a cada segundo uma sofre esta enfermidade; e a cada seis segundos esta doença é responsável pela morte de alguém.

9 Julho 2024
Sandra M. Pinto

Por ano, 15 milhões sofrem um AVC e, desses, seis milhões não sobrevivem. De acordo com a Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral, Portugal é, na Europa Ocidental, o país com a mais elevada taxa de mortalidade, sobretudo na população com menos de 65 anos. A prevenção é o melhor remédio, como explica nesta entrevista Luís Fontão, neurologista na Unidade Local de Saúde Entre Douro e Vouga e Membro da Sociedade Portuguesa do AVC.

Por que acontecem os acidentes vasculares cerebrais e quais são os principais fatores de risco para o AVC?
Os acidentes vasculares cerebrais (AVC) acontecem por uma obstrução (AVC isquémico) ou rutura (AVC hemorrágico) de vasos cerebrais. É fácil a analogia: uma conduta que nos abastece a casa, se ficar entupida ou rebentar, deixa-nos sem água. O cérebro tem muitas “condutas” e se uma área do cérebro fica sem “água” manifesta-se rapidamente com sintomas característicos.

A obstrução dos vasos (AVC isquémico) é habitualmente causada por arritmias cardíacas ou por exposição crónica aos chamados fatores de risco vascular: hipertensão arterial, diabetes, colesterol elevado, excesso de peso, tabaco e álcool. As causas de rutura (AVC hemorrágico) são semelhantes, sendo que a hipertensão arterial é particularmente importante nestes casos.

Assim, existem vários fatores relacionados com o estilo que vida que as pessoas podem, e devem, modificar para reduzir o risco de AVC. Saliento aqui a utilização de tabaco, o sedentarismo e o consumo de álcool como dos comportamentos de risco mais importantes. Além disso, é essencial o seguimento regular pelo/a médico/a de família para controlar a hipertensão, a diabetes e o colesterol. Por fim, a ocorrência de AVC aumenta com idade, contudo esse é um fator que infelizmente não podemos contrariar, exceto na promoção de um envelhecimento saudável.

Pessoas com familiares próximos que tiveram acidentes vasculares cerebrais apresentam maior risco de desenvolver a doença?
Existe um risco mais elevado de AVC em familiares de pessoas com esta doença. Esse risco pode dever-se a causas genéticas, mas também pode refletir hábitos de vida comuns na mesma família (tabaco, alimentação, sedentarismo) e deve reforçar o cuidado e a correção desses fatores.

Que alterações produz a hipertensão arterial nas artérias do cérebro?
A hipertensão arterial torna as paredes das artérias e dos pequenos vasos espessadas, pouco elásticas e mais fragilizadas. Ficam mais sujeitas quer à acumulação de aterosclerose, podendo causar obstrução (AVC hemorrágico), quer fragilidade que facilita a rutura do vaso (AVC hemorrágico). A analogia com as condutas também aqui é eficaz – a hipertensão crónica é como um agente que provoca a corrosão das condutas.

O acidente vascular cerebral é uma das doenças que podem apresentar os mais variados sintomas porque dependem da área do cérebro atingida pela hemorragia ou pela falta de circulação. Quais são os sinais mais frequentes doa AVC?
Os sinais mais comuns são conhecidos com os 3 F e não são o Fado, Futebol e Fátima. Refiro-me ao aparecimento súbito de dificuldades na Fala, assimetria da Face e falta de Força num membro (braço ou perna). Existem outros, mas estes são os mais importantes a reter.

O que se deve fazer perante a suspeita de alguém estar a sofrer ou ter sofrido um AVC?
Se se aperceber de alguém a queixar-se de um dos 3 F, nunca se deve desvalorizar nem esperar que passe. Deve-se ligar imediatamente 112 e seguir as instruções daquele serviço.

O tempo de espera entre um AVC e a chegada do INEM pode influenciar as “mazelas” futuras?
Para efeitos de impacto podemos imaginar que a cada minuto sem tratamento podem morrer até 4 milhões de neurónios. É uma doença em que o tempo até ao tratamento é da maior importância e, por isso, o principal é rapidamente “dar o alerta”, não desvalorizar e pedir ajuda ao 112. A probabilidade de uma melhor recuperação é maior se agirmos rapidamente.

Que dicas úteis podemos dar aos nossos leitores para agirem da melhor forma perante uma situação de AVC?
A melhor dica é prevenir. A segunda melhor – 3F: fala, face, força – ligar 112. Não esperar que passe, não desvalorizar, não beber água com açúcar ou tomar aspirina e menos ainda tentar dirigir-se ao hospital por meios próprios.

Quais os tipos de tratamento existentes?
Existem tratamentos para os vários tipos de AVC, felizmente mais eficazes nos últimos anos. Nas horas iniciais todos os minutos contam, ou seja, quanto mais rápido agirmos, mais cérebro se salva. Incluem tratamentos endovenosos ou endovasculares de dissolução ou remoção de trombos, e modificação da pressão arterial. Nos dias e semanas que se seguem ao AVC, é particularmente importante a permanência numa Unidade especializada em AVC e o início de reabilitação.

A prevenção é o melhor remédio?
Muito melhor que remediar. Não o sofrer é a melhor luta contra o AVC. Prevenir o AVC é prevenir muitas outras doenças e inclui hábitos de vida saudáveis, não iniciar ou parar com comportamentos de risco e ter um acompanhamento pelo/a médico/a de família adequado. As medidas são as de sempre: controlo da tensão arterial, adoção de dieta saudável, não fumar, evitar bebidas alcoólicas e evitar o sedentarismo com exercício físico regular. São segredos escondidos à vista desarmada.

 

 

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