Teve ontem lugar no Porto, na Fundação Cupertino de Miranda, a antestreia do filme-documentário “1506 – O Genocídio de Lisboa” que estará online gratuitamente em múltiplas plataformas a partir da meia-noite, em idiomas português, inglês, francês, castelhano e hebraico. A data não foi escolhida ao acaso.
Completa-se hoje, 19 de abril, mais um aniversário do início do massacre que durante três dias assassinou cerca de três mil judeus em Lisboa. As fogueiras tinham a altura de casas, numa cidade cheia de corpos despedaçados e onde cabeças eram passeadas na ponta de lanças.
A antestreia no Porto será seguida de um debate com a intervenção do historiador Joel Cleto, da antropóloga Marina Pignatelli, da presidente da B’nai B’rith Portugal Gabriela Cantergi e do director dos museus judaico e do Holocausto do Porto, Michael Rothwell.
Ontem realizaram-se já duas antestreias, seguidas de debate, em Telavive e Miami. Na Flórida destacaram-se, entre os oradores, Miriam Kassenoff, diretora do instituto de professores do Holocausto da Universidade de Miami, e Henry Green, professor de estudos religiosos da mesma instituição. Em Telavive, o debate foi dirigido por Michal Cotler-Wunsh, enviada especial de Israel para o combate ao antissemitismo, e Raheli Baratz-Rix, chefe do departamento de resiliência judaica da Organização Sionista Mundial.
De acordo com Michael Rothwell, também responsável pelo departamento cultural da Comunidade Judaica do Porto, a entidade que realizou a produção, “o massacre e as circunstâncias em que ocorreu são o tema e não o enquadramento. O guião foi realizado pelo nosso centro de investigação em respeito pelas fontes cristãs e judaicas da época e verificado pela Cátedra de Estudos Sefarditas “Alberto Benveniste” da Universidade de Lisboa”.
Neto de judeus alemães mortos em Auschwitz, Michael Rothwell refere existir uma conexão entre o genocídio de Lisboa e muitos outros que a história regista. “Houve sempre um combinado de estereótipos, alegria fanática e terrorismo do esquartejamento nos massacres que, por dois milénios, visaram os judeus em latitudes tão distintas como Alexandria, Granada, Sevilha, Madrid, Toledo, Barcelona, Basileia, Uberlingen, Estrasburgo, Colónia, Worms, Erfurt, Sevilha, Metz, York, Norwich, Trento, Troyes, Berna, Paris, Odessa, Moscovo, Hebrom e recentemente nas áreas fronteiriças do sul Israel.”
O responsável afirma que “o filme-documentário foi reduzido ao mínimo indispensável – cerca de 20 minutos – para que possa ser visto por todos, novos e menos novos, mesmo aqueles que prescindem de longas películas. O modelo também nos permite organizar visionamentos e debates em salas de cinema de todo o mundo, com convidados ilustres e intervenção da plateia, o que é especialmente relevante depois do massacre de 7 de outubro de 2023 em Israel.”
Com a participação de centenas de figurantes trajados e armados, o filme cujo trailer já tem mais de meio milhão de visualizações foi produzido pelo realizador portuense Luís Ismael e contou com atores e atrizes portugueses como Rui Spranger, Carlos Sebastião, Bel Viana, Filipe Amorim, Anabela Nóbrega, João Pamplona, Ângela Marques, Pedro Ferreira, Alfredo Pinto, Pedro Damião e Alexandre Martins.
Novas sessões e debates com especialistas estão já agendados para Lisboa, Madrid, Paris, Bruxelas, Munique, Londres, Joanesburgo e Sydney. Na capital portuguesa, o evento está agendado para o dia 2 de maio, no Cinema City do campo Pequeno, e o debate contará com as presenças confirmadas dos historiadores Susana Mateus e Jorge Martins, da analista Helena Ferro Gouveia, do escritor Francisco José Viegas e da jornalista Miriam Assor.
O novo filme-documentário sobre o massacre de Lisboa não é a primeira produção cinematográfica da Comunidade Judaica do Porto. O seu trabalho mais destacado é a longa-metragem “1618” – o filme português mais internacionalmente premiado de sempre – sobre a última grande visita do Santo Ofício à cidade do Porto. Uma outra produção – “Sefarad” – conta a história daquela comunidade centenária, com destaque para o papel do seu primeiro presidente, o capitão Barros Basto, conhecido internacionalmente como o “Dreyfus português” por ter sido expulso do exército, em 1937, em virtude de ter circuncidado os seus alunos, o que foi então considerado “imoral”.