Tentar contar ovelhas em movimento pode ser tão difícil como contar fósforos a saltar dentro de uma caixa. Mas a matemática tem uma solução engenhosa e até poética: um método chamado “captura-recaptura”, que nos ensina a estimar quantidades sem precisar de contar tudo ao detalhe.
A explicação foi recentemente apresentada num artigo da revista científica New Scientist, pela matemática britânica Katie Steckles, e mostra como esta técnica pode ser aplicada a tudo, desde rebanhos até garfos de cantina ou tanques de guerra.
A lógica é simples: em vez de contar todas as ovelhas, o pastor pode marcar uma amostra (por exemplo, 50 ovelhas com uma fita ou tinta especial) e libertá-las de novo no rebanho. Mais tarde, recolhe outra amostra e verifica quantas estão marcadas. Se, digamos, metade da nova amostra estiver marcada, é razoável supor que metade do total também esteja e, portanto, o rebanho terá cerca de 100 ovelhas.
Esta técnica, embora pareça artesanal, é na verdade um método estatístico sofisticado, usado em várias áreas da ciência, como biologia, ecologia, gestão de recursos e até epidemiologia. Permite estimar populações de animais, objectos ou até pessoas, especialmente quando o número exato é impossível de obter.
O truque que desarmou os tanques alemães
Durante a Segunda Guerra Mundial, os Aliados enfrentavam um problema estratégico: quantos tanques os alemães estavam a produzir por mês? A espionagem não dava respostas claras e a informação oficial estava, naturalmente, escondida. Mas os tanques capturados revelavam algo valioso: os números de série.
Assumindo que os números eram atribuídos de forma sequencial e aleatória, os estatísticos aliados criaram uma fórmula simples, mas eficaz. Se L for o maior número de série encontrado e n for o número de tanques capturados, então uma estimativa fiável do total de tanques seria L + L/n. Por exemplo, se o maior número de série observado for 80 e tiverem sido capturados 4 tanques, a estimativa aponta para cerca de 100 tanques.
Curiosamente, esta previsão – conhecida como o “problema do tanque alemão” – revelou-se mais precisa do que os dados dos serviços secretos. É um exemplo notável de como a matemática pode ser uma arma silenciosa, mas poderosa.
Katie Steckles partilha ainda um outro exemplo curioso. Numa escola, uma colega quis saber quantos garfos existiam na cantina. Algo difícil de contar, já que estavam constantemente a ser usados ou lavados. A solução? Os alunos pintaram discretamente uma pequena amostra de garfos com verniz de unhas e voltaram a colocá-los em circulação.
Dias depois, voltaram a recolher alguns e analisaram quantos estavam marcados. Com base nessa proporção, conseguiram estimar com bastante precisão o número total de talheres.
Para o leitor mais curioso, este truque pode ser uma nova forma de olhar para o mundo: perceber que nem tudo precisa de ser contado para ser compreendido. Basta uma boa amostra, um pouco de lógica e uma pitada de engenho. Ingredientes que não faltam à ciência, mas que também fazem parte da sabedoria de quem, ao longo da vida, aprendeu a observar antes de agir.
Afinal, como provam as ovelhas, os tanques e os garfos, a matemática pode ser tão útil quanto surpreendente. E, quem sabe, até ajudar a adormecer mais depressa, depois de contar só uma ou duas ovelhas.