Um estudo que envolveu um grupo de investigadores de 29 países, entre os quais Tiago Reis Marques, médico psiquiatra português e investigador do King´s College em Londres, recolheu e comparou milhares de imagens cerebrais obtidas por ressonância magnética de mulheres provenientes de 29 Países. Estes Países foram ordenados pela sua igualdade de género, de acordo com classificações internacionalmente reconhecidas. Este estudo mostrou, pela primeira vez, que a desigualdade de género tem um impacto nocivo nas estruturas cerebrais. O estudo foi publicado no dia 8 de maio na revista Proceedings of the National Academy of Science, uma das mais importantes revistas científicas a nível mundial.
“É reconhecido que a desigualdade de género tem um impacto social, ao criar um ambiente prejudicial para as mulheres. Sabemos por exemplo que mulheres que nascem em países onde a desigualdade de género é maior têm um risco de doença mental aumentado e uma pior performance académica, quando comparado com homens e com mulheres de países onde existe igualdade de género. Esta foi a premissa que nos motivou a desenvolver este estudo, para perceber se a desigualdade de género provoca alterações cerebrais e perceber os mecanismos neuronais associados”, começa por explicar o investigador Tiago Reis Marques.
“Assim, foram analisados volumes de diferentes estruturas cerebrais, assim como a espessura do córtex (massa cinzenta), pois a menor espessura do córtex está normalmente associada a disfunção cognitiva. Esta análise foi controlada e teve em conta várias variáveis, como a idade das mulheres, produto interno bruto (PIB) de cada país, entre muitos outros fatores, para evitar qualquer viés e explicação alternativa para os resultados encontrados,” continua.
Os resultados permitiram chegar a observações interessantes: “Em países com maiores níveis de igualdade de género não existem diferenças na espessura cerebral entre homens e mulheres e, em alguns países, até foi demonstrado uma maior espessura cerebral nas mulheres que nos homens. Por outro lado, nos países com maior desigualdade de género a espessura cerebral das mulheres era inferior à dos homens. E, apesar da redução da espessura cerebral ser global, esta era mais evidente no hemisfério direito e em regiões cerebrais que controlam a resiliência à adversidade, controlo emocional e resposta de stress.”
Contudo, como principal conclusão o investigador destaca que “pela primeira vez mostrámos que existe uma consequência neurobiológica desta variável ambiental que é o fenómeno social da desigualdade de género. As alterações cerebrais observadas podem explicar porque é que as mulheres têm maior risco de doença mental ou um maior risco de declínio cognitivo.”
“Este estudo permite também perceber, enquanto sociedade, que a desigualdade de género não é simplesmente um conceito abstrato ou uma mera construção social. É real e tem um impacto biológico observável. Existe, desta forma, além de um imperativo moral e social, um imperativo biológico na promoção da igualdade de género. Estes dados devem ser tidos em conta em futuras implementações de políticas públicas nacionais, principalmente naqueles onde a desigualdade de género é mais evidente. Espero que cada vez mais se observe um contributo das neurociências no apoio às políticas sociais,” conclui Tiago Reis Marques.