Em declarações à Lusa a propósito do Dia Mundial do Sono, que hoje se assinala, a especialista da Comissão de Trabalho de Patologia Respiratória do Sono da Sociedade Portuguesa de Pneumologia lembrou que os estudos do sono “estão muito atrasados” e que até chegar ao diagnóstico, para muitas pessoas, esta é “uma longa caminhada”.
“Temos pessoas que esperam para a consulta cerca de três meses, mas há sítios onde as consultas podem estar até um ano atrasadas. Depois da espera para ser avaliada em consulta, de houver suspeita de apneia do sono, muitas vezes vai ter de esperar para o exame”, disse a especialista, sublinhando que, nalguns locais, pode demorar mais de um ano.
Até ao diagnóstico, quem sofre de apneia do sono e não sabe corre riscos cardiovasculares, de enfarte, risco de arritmia ou de descontrolo da tensão, de acidente vascular cerebral e até metabólico.
“Por exemplo, nas pessoas com diabetes é muito difícil o controlo da doença com medicação quando a apneia do sono não está tratada”, exemplificou.
A pneumologista destacou ainda que a “síndrome do sono insuficiente” – um adulto dormir menos do que as sete a nove horas por noite – é “altamente prevalente na população”.
“As pessoas continuarem a achar que dormir mal é uma coisa normal, sobretudo se lhes acontece há muito tempo, (…) e desvalorizarem os sintomas. Isto é uma coisa que nós vemos recorrentemente na consulta”, afirmou.
A propósito da falta de literacia em saúde nesta natéria, insistiu: “Ainda há muito a ideia de que o ressonar durante a noite é normal, sobretudo nos homens. Acham todos que é normal, e não é, sabemos cada vez mais que tem riscos e que muitas vezes está associado a uma apneia do sono”.
Vânia Caldeira fala ainda de alguns sintomas que as pessoas não conhecem, ou desvalorizam, como o impacto no humor, o facto de a pessoa nunca conseguir concentrar-se e até ter dificuldades de produtividade no trabalho.
“A pessoa quando pensa qual será a causa não a associa ao sono, mas muitas vezes vem daí”, disse, considerando que há também “um medo do diagnóstico de apneia do sono”, porque continua a estar muito associada à máquina de tratamento com que têm de dormir.
Salienta que a sonolência diurna excessiva, que é muito associada à apneia do sono, só acontece em um quarto a metade dos doentes e alerta: “Muitos doentes se estiverem à espera desta sonolência não vão chegar ao diagnóstico”.
A especialista insiste no impacto que a apneia do sono pode ter do ponto de vista cognitivo, de dificuldades de memória, de concentração, atenção e inclusive de aprendizagem.
A este respeito, fala nos adolescentes, explicando: “por causa de alterações hormonais típicas da puberdade, já têm uma tendência a ter um horário mais tardio, (…) a ter alguma dificuldade em adormecer se forem muito cedo para a cama. Ao contrário, de manhã, para eles é muito difícil acordar”.
“Por isso insistimos tanto na temática de se ter cuidado com os dispositivos eletrónicos à noite, sobretudo nos adolescentes”, disse, acrescentado: “se eles levarem com um ‘boost’, de exposição à luz de computadores ou dos dispositivos eletrónicos isto vai atrasar ainda mais a produção de melatonina”, fazendo com que adormeçam mais tarde.
Vânia Caldeira fala ainda de comorbilidades muito prevalentes na população que muitas vezes andam “de mão dada” com a apneia do sono: “A hipertensão, a diabetes, as arritmias, nomeadamente a fibrilhação auricular, pessoas com história de enfarte, assim como pessoas com depressão”.
Nestes casos, defende que deve ser feita uma avaliação para a apneia do sono, lembrando que, para isso, o aceso aos cuidados primários é essencial, pois é o médico de família que pode encaminhar o doente para o especialista.
SO // ZO
Lusa/fim