O estigma com a menstruação pode parecer apenas uma injustiça, mas, na verdade, tem consequências muito mais nefastas do que pode aparentar. Pode apresentar-se das mais variadas formas e levar a pouca qualidade de vida, doença, entre outros problemas sociais.
Este não devia ser o caso quando, na verdade, este preconceito é apenas resultado de mitos, má comunicação, equívocos e informação errada. Não serve nenhum propósito e prejudica em grande medida a vida das suas vítimas. No fundo, a menstruação é normal, natural e uma parte saudável do ciclo reprodutivo.
O que é o estigma menstrual?
Este conceito vago descreve a discriminação que as pessoas que menstruam enfrentam. Este estigma pode manifestar-se de várias formas: como a falta de acesso a produtos de higiene menstrual, dificuldades financeiras, educação reduzida, falta de trabalho e oportunidades e discriminação verbal.
Mas, de forma geral, como é que o estigma menstrual afeta as pessoas?
As consequências nefastas do estigma com a menstruação
Mulheres que se sentem envergonhadas, vítimas de abusos verbais e que não têm acesso a produtos menstruais é apenas a ponta do iceberg. Existem muitas mais consequências, profundamente mais negativas, que podem afetar o percurso destas pessoas. Aqui estão algumas dessas repercussões:
1. Implicações na educação
1 em cada 10 meninas em África falta à escola durante a menstruação, o que corresponde a 10/20% dos dias de escola. Isto carrega um grande número de consequências negativas.
Muitas meninas que frequentam a escola acabam por desistir, de uma forma geral, do ensino, pois começam a reprovar e a ter más notas, incapacitando-as de receber a educação adequada e necessária. Isto pode gerar um maior risco de se tornarem noivas enquanto menores de idade (child-brides), ou engravidarem. Para além disso, torna-se mais difícil arranjar trabalho graças ao baixo nível de educação, o que pode resultar em problemas financeiros e outras dificuldades.
Condições de vida perigosas e pouco higiénicas = Pobreza menstrual
Em países subdesenvolvidos, há uma grande falta de acesso a casas de banho adequadas ou água limpa. E apesar disto afetar todos os envolvidos, meninas e mulheres têm um problema acrescido, uma vez que não são capazes de gerir a sua menstruação de forma segura e higiénica.
Para além disso, muitos destes países escasseiam em fornecedores de produtos e soluções para a menstruação, dificultando o ato de sair de casa para estas jovens e mulheres. Esta escassez pode ter implicações significativas na saúde física e mental das pessoas afetadas por estas carências. No entanto, mesmo em países mais desenvolvidos, a pobreza menstrual está presente. Para muitos, escolher entre comida e produtos menstruais é uma realidade e, para outros, ter acesso a estes produtos não é sequer uma opção. O Banco Mundial estima que pelo menos 500 milhões de mulheres e jovem por todo o mundo, não têm acesso a produtos básicos para lidar com a menstruação. A UN Women acrescentou também as consequências da pobreza menstrual às suas estatísticas. Concluiu-se que, em 2019, 1.25 mil milhões de mulheres e meninas não têm acesso a casas de banho seguras e privadas e 526 milhões não têm acesso a casas de banho, de todo.
No fundo, esta é uma questão de direitos humanos, que resulta de uma enorme falta de dignidade e de direitos de autonomia e livre-arbítrio corporal.
2 Implicações médicas
Foi estimado que metade das mulheres com falta de acesso a produtos menstruais e serviços de saúde femininos em certos países subdesenvolvidos têm de usar trapos, relva ou papel durante o período. Isto é extremamente perigoso e pode causar infeções.
Para além disso, a mutilação genital feminina (MGF) ainda é uma realidade em muitos países africanos, o que pode contribuir para graves perigos de saúde. Falemos também de rituais ancestrais realizados em certos países. O Chaupadi, por exemplo, é uma prática das áreas mais rurais do Nepal e envolve jovens e mulheres adultas que são trancadas em barracões durante a menstruação, uma vez que esta é vista como “um sinal de azar”. Nestes barracões, estas mulheres não têm acesso aos produtos básicos necessários, o que pode gerar uma panóplia de questões de saúde, bem como problemas físicos e psicológicos.
3. Body Shaming
O estigma menstrual pode ter consequências profundamente negativas na forma como uma mulher ou jovem se vê a si própria. Este preconceito pode, por exemplo, gerar decrescentes níveis de bem-estar físico e mental, baixos níveis de satisfação e expectativas sexuais e pode fazê-las sentir socialmente pouco relevantes.
A religião é um campo onde esta discriminação é muito comum. Há um termo tradicional judaico – “niddah” – que se refere ao ato de uma mulher dormir separada do seu marido durante a menstruação e, no Islamismo, as mulheres são vistas como “impuras” durante o período e são dispensadas das orações.
Outra agravante são todos os mitos que geram motivos de vergonha e humilhação nos corpos femininos. Um deles, que é bastante comum, é a crença de que o uso de um tampão pode “tirar a virgindade” a uma jovem.
4. Vergonha
Para além do Body Shaming, o Period Shaming também é uma realidade, ou seja, a vergonha gerada pela menstruação. Num artigo redigido por Valerie Seibert, de seu nome “Quase metade das mulheres já experienciaram Period Shaming”, é mencionado que “58% das mulheres já se sentiram envergonhadas simplesmente porque estavam menstruadas”.
Vejamos os anúncios de produtos de higiene feminina. Será que estas são representações realistas da menstruação? Não só as mulheres destes anúncios transparecem um grande amor pelo momento da sua menstruação, o que raramente se verifica na sociedade, como também o discurso transparece um grande secretismo e pureza em torno do tema. Até a empresa “Kotek”, uma marca de produtos menstruais muito popular nos EUA, disse uma vez num dos seus anúncios em 2013, “Não te preocupes. Nem a tua crush vai saber que estás com o período.”
Assim, é obvio que as jovens têm sido condicionadas socialmente para acreditar que pedir, usar ou comprar produtos menstruais é profundamente embaraçoso e motivo de grande secretismo. Pensemos no ato de ter de levar um penso higiénico ou um tampão da sala de aula até à casa de banho. Geralmente as jovens escondem-nos nas mangas da camisola, ou na cintura das calças. Ou a vergonha que muitas mulheres sentem no trabalho ao levar uma pequena bolsinha para a casa de banho, uma vez que não querem ser vistas com produtos menstruais na mão.
A principal questão em relação ao Period Shaming é que impede conversas abertas e honestas nas escolas, em casa, ou nos media sobre este tema e, consequentemente, a aceitação e normalização da menstruação, uma função corporal completamente normal e necessária, e que representa um sinal de saúde.
6. Tampon Tax – “Taxa do tampão”
É importante também refletir sobre o chamado “Tampon tax”. Em vários países, os produtos menstruais estão enquadrados, na tabela do IVA, como um Luxo ou Item Não-Essencial. Isto torna-os muitos mais caros do que deveriam ser tendo em conta que se tratam, na verdade, de produtos essenciais para a higiene da mulher. Enquanto que muitos países já aboliram o valor acrescentado, ainda se apresenta uma realidade em muitos países.
Muito pode ser feito para colaborar para o fim do estigma menstrual. Primeiramente, a educação adequada em relação ao tema da menstruação nas escolas, para todos os géneros (sim, os meninos também devem ter o máximo de conhecimento sobre a menstruação); depois, conversas abertas e honestas entre educadores e alunos, evitando nomes de código como “o Benfica joga em casa”, “aqueles dias”, ou “aquela altura do mês”; para além disso, defender um maior e melhorado acesso a produtos menstruais, serviços de saúde e apoio da sociedade como um todo. Todos podem cumprir o seu papel na tentativa de eliminar o preconceito e celebrar este acontecimento mensal, completamente normal e que futuramente poderá gerar uma nova vida.