Considerando alguns estudos que relacionam felicidade e dinheiro, o site Gauchazh responde que “sim, mas”.
Nações ricas são mais felizes?
Primeiro, é preciso definir o conceito de felicidade, amplo e subjetivo, mas que, em geral, pode ser considerado um estado emocional positivo. À sensação de felicidade estão associados o prazer, o bem-estar e a perceção de sucesso.
— Tem muito a ver com satisfação e o quanto a expectativa das pessoas está a ser cumprida na vida que elas têm. Se existe uma distância muito grande entre o que você consegue e o que você espera, mais insatisfação haverá.
O psicólogo americano Ed Diener, da Universidade do Illinois, é uma das autoridades mundiais nos estudos sobre o conceito de bem-estar subjetivo, que é a maneira como as próprias pessoas avaliam as suas vidas. Ele investiga o impacto da personalidade, da cultura e, claro, do dinheiro para que um indivíduo se sinta satisfeito e feliz.
No livro Culture and Well-Being: The Collected Works of Ed Diener, de 2009, o psicólogo mostra que as nações que acumulam mais riquezas conseguem atingir menor índice de mortalidade infantil, garantir fundos para a ciência, investir em parques e locais públicos para lazer. Mas nessas sociedades mais ricas, segundo Diener, serviços e bens extras impactam muito pouco no nível de bem-estar subjetivo dos indivíduos. Ao mesmo tempo, os cidadãos desses países sentem que têm pouco tempo e trabalham mais. Ou seja, se você tem o básico, como saúde, educação, oportunidades para concretizar as suas aspirações e boas relações sociais, talvez a busca incessante por bens materiais tenha mais impacto negativo do que positivo na felicidade.
«As pessoas procuram um nível de riqueza material impensável para gerações anteriores e sacrificam o seu tempo e os seus relacionamentos para obter isso. No entanto, elas deveriam reavaliar as suas prioridades. Essa procura é pouco provável que valha a pena», escreve.
Pedro Henrique de Morais Campetti, professor de economia do Instituto Federal do Rio Grande do Sul, analisou a literatura e juntou dados de outros países, como Brasil, Argentina, Chile e México, sobre os fatores que impactam a felicidade. O especialista afirma que países com rendimentos mais elevados têm maiores “taxas de felicidade”, mas o crescimento não é proporcional ao aumento da renda. Mesmo com mais riqueza, o nível de felicidade permanece estagnado.
— A felicidade depende de vários fatores, e o rendimento é um deles, mas há também aspetos culturais e comportamentais, e a saúde é o que mais impacta. E quando o assunto é saúde mental, o rendimento da pessoa deixa de ter influência.
— Não se pode dizer que a depressão é mais comum na população pobre. O que vemos é uma maior dificuldade no seu tratamento. Veja-se uma ida às compras e compare-se à toma de um analgésico para dor. Pode ser que exista uma alegria momentânea, mas isso não quer dizer que haverá mudança a longo prazo.
— O consumo pode tornar-se patológico, chegando a um ponto em que a pessoa não consegue parar. O consumo faz uma pessoa trabalhar mais e se stressar, não traz um estilo de vida com mais qualidade.
O tecto do bem-estar
Angus Deaton e Daniel Kahneman, vencedores do Prémio Nobel da Economia, publicaram em 2010 um dos estudos mais famosos que relacionam o aumento de rendimento de uma pessoa com o seu bem-estar emocional (um conceito que tem a ver com as experiências diárias de prazer, stress, tristeza, raiva e afeto) e a perceção própria sobre a vida. Eles constataram que mais dinheiro não compra mais felicidade, mas ter pouco dinheiro está associado a sofrimento emocional.
Com base em questionários feitos nos Estados Unidos, chegaram a um número exacto capaz de trazer felicidade familiar: US$ 75 mil por ano. Ganhar acima desse valor não traz significativamente mais bem-estar emocional.
«Um aumento além deste valor não melhora a habilidade de um indivíduo de fazer o que importa mais para o seu bem-estar emocional, como passar tempo com as pessoas que gostam, evitar dor e doença e aproveitar o lazer», concluíram.
O valor corresponde ao país norte-americano — em sociedades com outros desafios, como desigualdade social, o valor pode ser significativamente menor.
Isso não quer dizer, segundo os cientistas, que uma mudança para mais ou para menos não teria consequências emocionais. O que importa é que, a partir desse ponto, o bem-estar emocional de uma pessoa é mais impactado por outros fatores. A adaptação humana a uma determinada situação também influencia: afinal, pessoas ricas acostumam-se a essa condição. A vida rica transforma-se numa vida normal.
Invista na sua felicidade
Mas se o dinheiro pode comprar felicidade, por que não compra? Porque não sabemos gastar, argumenta a pesquisadora e professora Elizabeth Dunn, do Departamento de Psicologia da Universidade de British Columbia.
«As pessoas não conhecem os factos científicos sobre felicidade, o que a traz e o que a mantém. Elas não sabem como usar o dinheiro para comprá-la”, escreve.
Para Elizabeth Dunn, não é surpreendente que um milionário que nada entende de vinho tenha uma adega em casa, mas prefira mesmo beber cerveja. «E não é surpreendente que pessoas com muito dinheiro não tenham vidas mais felizes», afirma. O dinheiro é uma oportunidade para a felicidade, mas nem todos sabem como aproveitá-la.
A pesquisadora explica que investir em experiências é melhor, uma vez que nos adaptamos às coisas de uma forma muito rápida.
Em 2016, um estudo de Cambridge cruzou dados bancários e o traço de personalidade de 625 participantes. A conclusão é semelhante à de Elizabeth Dunn: o dinheiro, se investido da maneira correta, pode aumentar o bem-estar. Pessoas extrovertidas, por exemplo, sentiriam-se mais felizes gastando com idas a um bar do que pessoas introvertidas.
Sandra Matz, do departamento de psicologia da mesma universidade, diz que isso mostra que gastar dinheiro em produtos que ajudam indivíduos a se expressar de acordo com a sua personalidade pode ser tão importante quanto encontrar um trabalho certo ou os amigos ideais.
Considerando que as pessoas têm uma tendência para se comparar com os outros e comprar coisas que as posicionem em num certo lugar de status social, a procura pelos bens que possam fazer cada um feliz depende de um processo mais longo.
É uma questão de autoconhecimento, de saber o que o faz realmente feliz.
Pessoas felizes conseguem mais dinheiro
O italiano Eugenio Proto, professor de economia da Universidade de Warwick, no Reino Unido, é o responsável por um estudo que mostra que a felicidade vem antes do dinheiro: pessoas felizes tendem a ser mais produtivas. O economista afirma que a personalidade tem relação direta com a capacidade de ser feliz a partir do dinheiro.
«Se você não tem como dar comida aos seus filhos ou ter uma casa, você não vai ser feliz. Mas a partir do momento em que passa disso, a personalidade influencia bastante », afirma.
O economista investigou a relação entre o rendimento e o bem-estar das pessoas que têm maior risco de depressão ou de sensibilidade a sentimentos como raiva ou hostilidade. Ele constatou que, nesses casos, mais dinheiro não torna necessariamente alguém mais feliz.