0O stress tornou-se uma característica do século XXI, contribuindo para crises de saúde mental, alimentando o ‘boom’ de aplicações digitais e a ciência sugere que até já pode afetar a vida dos bebés que ainda estão dentro da barriga. Alguns especialistas, em conversa com o jornal The Guardian, revelam como algum stress, conhecido como “eustress”, pode ser bom, saudável e produtivo. Além de que sem ele, acrescentam, as nossas vidas seriam monótonas e sem sentido.
A noção de “eustress” tem um sentido intuitivo no prefixo “eu”, que é do grego antigo para “bem” ou “bom”. A neurocientista Daniela Kaufer explica que mesmo quando «as pessoas dizem que se sentem um pouco stressadas», se podem estar apenas a referir a situações em que «os sentimentos associados à adrenalina estimulam o nosso desempenho». A especialista dá o exemplo dos testes escolares como uma situação stressante que pode ter bons resultados.
Segundo a neurocientista da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, «existe a perceção de que o stress é sempre mau para o cérebro, mas isso não é verdade». A resposta ao stress pode ser essencial para a sobrevivência, pois, assim, podemos melhorar o nosso desempenho, através do aumento da atenção e da concentração. Algo que pode preparar «para uma adaptação mais fácil à próxima coisa que surgir na vida».
A equipa de investigação, liderada por Daniela Kaufer, encontrou evidências fisiológicas do poder do “eustress”. Na comparação da atividade no hipocampo de ratos expostos a uma situação de stress prolongado e no de humanos em uma situação de “eustress” verificou-se o impacto do exercício na área do cérebro «envolvida nas aprendizagens e na memória». No caso dos humanos desencadeou, ainda, o crescimento de novos neurónios. A especialista atestou que «esses neurónios, como pudemos demonstrar, são ativados seletivamente e ajudam na aprendizagem da próxima situação stressante. Então em futuras situações semelhantes vai estar melhor preparado».
Porém, a cientista avisa que «isso não significa que devemos exagerar nas coisas, pois os efeitos positivos do “eustress” são inibidos». Na analogia dos exames escolares, pode «não se lembrar de coisas que realmente sabe».
Portanto, é altamente recomendável abraçar mais situações que lhe pareçam assustadoras, e que «o forcem a sair da sua zona de conforto», como por exemplo: andar numa montanha-russa, falar em público, ou ir a entrevistas de emprego. O professor de psicologia na Universidade Keele, no Reino Unido, Richard Stephens, concorda e diz «que é possível converter sofrimento em “eustress”, reformulando situações stressantes em desafios positivos – e colher os benefícios».
Para tal, o especialista informa que «em vez de estarmos à disposição das nossas emoções, devemos aplicar estratégias diferentes para obter resultados favoráveis» e sugere coisas tão fáceis como «atenção plena, evitar certas situações que o angustie ou qualquer outra coisa que ajude a elevar o humor, como exercício, uma dieta saudável ou um descanso suficiente». Reformular certos pontos de vista das situações, em que pode tornar algo «bastante negativo numa coisa numa coisa mais positiva» também pode ajudar.
Daniela Kaufer diz que «os limiares de stress são mais altos que outros em cada pessoa, dependendo dos genes, história de vida ou, até, o que aconteceu quando ainda estava no útero». Muitos desses fatores estão além do nosso controlo, pelo que «é importante não fazer com que ninguém se sinta responsável por ter certas respostas ao stress», diz a especialista.
Já a professora de psicologia Jennifer Ragsdale, da Universidade de Tulsa, nos Estados Unidos, sugere «experimentar o “eustress” quando tem um trabalho stressante», nomeadamente, a ver «os prazos e a carga de trabalho como um desafio a ser cumprido ou uma oportunidade de crescimento, e não como algo impossível de lidar». Além de que, também deve «refletir sobre os lados positivos do seu trabalho e o que traz significado ou sensação de propósito ao seu trabalho». Em que vale investir sua energia e o que não vale? ”
A investigação de Ragsdale descobriu que «a energia e a excitação associadas ao “eustress” podem combater a fadiga». A especialista concluiu que as pessoas com «indicadores de eustress [sentindo-se felizes ou experimentando mais significado durante a jornada de trabalho] – geralmente experimentam níveis mais baixos de fadiga em geral».
Richard Stephens alegou mesmo que o “eustress” pode ser «desejável e até necessário», pois é nessas situações «que demonstramos que somos ativos no mundo». «Sem desafio, vem o tédio. Uma vida sem stress não é digna de ser vivida», acrescentou o psicólogo britânico.