Investigadores desvendam novo método para aproveitar o potencial da pele do tomate

Num artigo de capa da ACS Sustainable Chemistry and Engineering, uma equipa liderada por cientistas do ITQB NOVA mostrou grandes avanços na utilização de resíduos de pele de tomate para desenvolver misturas antimicrobianas

Nos últimos anos, os resíduos agroindustriais têm sido explorados para o desenvolvimento de bioplásticos, suplementos alimentares, entre outras aplicações. Na Europa, foram processadas cerca de 10 milhões de toneladas de tomate em 2020, gerando milhões de toneladas de bagaço de tomate (resíduos de peles, sementes e pedúnculos).

Num artigo divulgado na capa da ACS Sustainable Chemistry and Engineering, uma equipa de investigadores do Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier da Universidade NOVA de Lisboa (ITQB NOVA) e do Institut National de la Recherche Agronomique (INRAE, em França) mostraram que é possível extrair misturas bactericidas da pele de tomate num processo simples e sustentável.

A pele é a armadura das frutas, agindo como uma barreira contra a perda de água e as agressões externas, incluindo a invasão de agentes patogénicos. A cutícula é a camada mais externa da pele da fruta e é principalmente composta pelo polímero cutina. Este polímero (rede de moléculas), que é extremamente abundante na natureza, é essencial na barreira defensiva, nomeadamente fornecendo propriedades antimicrobianas à pele da fruta. O tomate é um modelo chave nos estudos sobre a cutina porque esta pode ser facilmente extraída.

Portugal é o terceiro maior processador de tomate na Europa, sendo que o bagaço resultante é principalmente canalizado para alimentação de gado. Neste artigo, a equipa de cientistas liderada pela investigadora principal do ITQB NOVA, Cristina Silva Pereira, expande o conhecimento sobre o potencial deste resíduo como fonte de misturas antimicrobianas extraídas da cutina, através de um método rápido, simples e sustentável.

Dependendo do processamento ou dos métodos de cultivo, a composição dos bagaços pode variar significativamente. A equipa estudou o processo de extração de dois bagaços de tomate, com origem em diferentes países. Para tal, utilizaram um sal líquido que permite a recuperação da cutina com alterações mínimas, separando-a dos restantes componentes. Este líquido é biodegradável, biocompatível e pode ser reciclado ou reutilizado.

Em seguida, os investigadores processaram a cutina extraída e testaram a atividade antibacteriana das misturas resultantes. As misturas revelaram-se eficazes contra duas bactérias distintas responsáveis por infeções habitualmente difíceis de tratar – Staphylococcus aureus e Escherichia coli. Ainda assim, foram identificadas algumas diferenças na eficácia contra E. coli dependendo da origem do bagaço.

“Existem vários estudos que já exploraram o potencial da pele de tomate como fonte de cutina” afirma Rita Escórcio, que tem estudado este processo durante o seu doutoramento. “No entanto, dependem de processos com vários passos. Nós fomos capazes de fornecer prova de conceito de que é possível usar bagaço de tomate para extrair cutina através de um método rápido, simples e sustentável. A cutina pode depois ser processada para obter misturas com propriedades antimicrobianas.” No futuro, estas misturas podem ser utilizadas para desenvolver novos biomateriais antimicrobianos.

“Esta é uma importante contribuição para o futuro da utilização circular de bagaços de fruta”, complementa Cristina Silva Pereira, líder do laboratório de Micologia Ambiental e Aplicada, onde Rita Escórcio está a desenvolver o seu doutoramento. “São ainda necessários mais estudos para otimizar a produção de misturas bactericidas a partir de qualquer fonte de cutina. No futuro, o objetivo é elevar este processo à escala industrial, naturalmente focando aplicações na área dos biomateriais”.

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