Num conjunto de recomendações divulgado na passada quinta-feira, a Comissão Europeia propõe três eixos centrais para aumentar a poupança para a reforma: ferramentas de rastreamento de pensões, dashboards consolidados destinados aos governos e a criação de mecanismos de inscrição automática em planos complementares.
As propostas foram desenvolvidas no âmbito da União de Poupança e Investimento (SIU), programa coordenado por Maria Luís Albuquerque, comissária europeia responsável pelos Serviços Financeiros. É este grupo de trabalho que tem inspirado várias medidas destinadas a transformar os hábitos de poupança na Europa, incluindo a criação das contas poupança-investimento.
Portal único para ver toda a carreira contributiva
A primeira recomendação passa pela criação de um sistema digital que permita a cada cidadão consultar, num único portal e de forma gratuita, todos os direitos de pensão acumulados, incluindo aqueles resultantes de trabalho em diferentes países ou regimes. A Comissão defende que esta visão consolidada facilita planeamento e transparência.
Dashboards para avaliar a saúde dos sistemas de pensões
Paralelamente, Bruxelas quer disponibilizar aos governos um dashboard que permita monitorizar, de forma contínua, a cobertura, a sustentabilidade e a adequação das pensões. Especialistas têm alertado que esta avaliação tem sido negligenciada durante décadas, impedindo reformas informadas.
Inscrição automática em planos complementares
A medida mais disruptiva do pacote é a introdução da inscrição automática em esquemas de pensões complementares. Em vez de esperar que os trabalhadores tomem a iniciativa de aderir, a regra passa a ser a inscrição por defeito, com liberdade para sair dentro de prazos definidos.
A Comissão sublinha que este modelo — já adotado no Reino Unido, Nova Zelândia e, em breve, Irlanda — aumenta significativamente a participação, sobretudo entre quem tende a adiar decisões financeiras. Para minimizar resistências, recomenda que as contribuições comecem em níveis reduzidos, aumentando gradualmente.
Bruxelas também defende que sejam criados critérios amplos de elegibilidade, permitindo que trabalhadores independentes, pessoas com vínculos atípicos ou contratos não-standard possam integrar estes esquemas, com maior flexibilidade nas contribuições.
Menos escolhas, mais simplicidade
Outro problema identificado pela Comissão é o excesso de opções de investimento oferecidas pelos planos complementares, o que muitas vezes paralisa quem tem menor literacia financeira. Por isso, recomenda a existência de soluções padrão, com apenas algumas opções adicionais, para reduzir a complexidade no momento da adesão.
Incentivos fiscais e mobilidade
O pacote prevê igualmente incentivos fiscais para estimular as contribuições, tanto por parte dos trabalhadores como das empresas. Entre as recomendações estão deduções no rendimento coletável até limites específicos, e benefícios fiscais para empregadores.
A Comissão alerta ainda para a necessidade de garantir que estes incentivos não são perdidos quando um trabalhador muda de emprego ou se desloca para outro país — uma questão especialmente relevante para Portugal, tendo em conta a elevada mobilidade da sua população ativa.
Parcerias sociais continuam centrais
Bruxelas faz questão de sublinhar que estas recomendações não interferem com o papel dos parceiros sociais. O objetivo não é substituir os acordos que existem em vários países — como os fundos de pensões ocupacionais em Portugal — mas sim complementá-los, assegurando que o novo modelo não põe em causa sistemas já consolidados.
Um processo longo, mas decisivo
Com estas três ferramentas — rastreamento, dashboards e inscrição automática — a Comissão pretende renovar a forma como a Europa se prepara para o envelhecimento da população. Mas alerta que as recomendações são apenas o início: caberá agora aos Estados-membros negociar e adaptar as propostas, num processo que deverá ser longo e exigente, dadas as diferenças económicas e demográficas entre países.










