A relação da COVID-19, doença infeciosa, com a obesidade, doença crónica, veio trazer para a ordem do dia esta temática, quebrando a ideia de serem vistas como doenças opostas.
Esta relação obriga, de certa forma, a pensarmos de forma diferente os determinantes da doença infeciosa, nomeadamente, os malnutridos por excesso, que são os obesos, com repercussões e influência significativa na COVID-19 (infeção pelo vírus SARS-CoV-2) e com efeitos na função pulmonar (dos pulmões), explica a nutricionista, Maria Neto.
Quais as causas da obesidade?
A obesidade é uma doença crónica, que se pauta pela acumulação excessiva de massa gorda corporal, com latente impacto negativo na saúde, tendo implicações no aparecimento e desenvolvimento de diferentes patologias como a diabetes, a doença cérebro e cardiovascular, a patologia osteoarticular e alguns dos cancros.
Resulta do excesso de ingestão de calorias. Ao consumir mais do que aquilo que necessita, ou seja, ao consumir mais energia do que aquela que dispende/gasta, a gordura acumula-se no organismo. As necessidades energéticas necessárias variam conforme a pessoa, dependendo da idade, do sexo, do nível de atividade física e da taxa metabólica.
Uma vida sedentária e a ingestão de calorias acima das necessidades energéticas individuais são o combustível perfeito para a obesidade.
Quais os benefícios da perda de peso?
A perda de peso em situações de obesidade ou excesso de peso, manifesta-se em ganhos em saúde, nomeadamente, na melhoria da qualidade de vida, na redução da mortalidade e na melhoria das doenças crónicas associadas, com realce para a diabetes mellitus tipo 2.
Os principais fatores de risco a combater são o sedentarismo e a alimentação inadequada. Para tal, é importante analisar os estilos de vida e alterá-los, caso necessário, tendo por base uma alimentação saudável, equilibrada, variada, completa e adequada a cada enquadramento clínico.
A alimentação de má qualidade, sem interesse do ponto de vista nutricional é responsável pelo aparecimento de várias doenças, como a obesidade, diabetes mellitus tipo 2, doenças cardiovasculares e oncológicas.
Como posso saber se estou em risco de estar obeso?
A obesidade pode ser avaliada com recurso ao valor do Índice de Massa Corporal (IMC) que permite obter a razão entre o peso e o quadrado da estatura, ou seja, permite saber se o peso de adequa à altura.
Classificação / IMC (kg/m2):
Baixo peso <18,5
Peso normal 18,5 – 24,9
Excesso de peso >= 25
Pré-obesidade 25 – 29,9
Obesidade >= 30
Classe 1: 30 – 34,9
Classe 2: 35 – 39,9
Classe 3: >= 40
Porém, o risco metabólico indica o risco de vir a desenvolver doenças associadas à obesidade. Mede-se com recurso ao Índice de Massa Corporal (IMC) e à avaliação do perímetro abdominal.
O que é a COVID-19?
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a COVID-19 é uma doença provocada pelo novo coronavírus SARS-COV-2, que pode causar infeção respiratória grave, como a pneumonia.
Os coronavírus são um grupo de vírus que podem causar infeções. Normalmente associadas ao sistema respiratório, podendo ser parecidas a uma gripe comum ou evoluir para uma doença mais grave, como a pneumonia.
Repercussões na função pulmonar dos obesos
A infeção pela COVID-19 tem um impacto desproporcional nos doentes com obesidade. Os dados disponíveis até ao momento permitem concluir que, a obesidade aumenta a suscetibilidade individual à infeção por SARS-CoV-2, assim como o risco de complicações graves e morte por COVID-19.
A obesidade apresenta repercussões na função pulmonar, visto que o doente obeso apresenta propensão para maior resistência nas vias aéreas, um menor volume de reserva expiratório, menor capacidade funcional, músculos respiratórios mais enfraquecidos e complacência do sistema respiratório, fatores críticos na defesa contra a COVID-19.
Ser obeso aumenta o risco de infeção e das suas complicações a nível individual. Recentemente, alguns trabalhos colocam a hipótese de a obesidade poder aumentar o grau de contágio das infeções respiratórias virais.
Mitigação da COVID-19
Acresce às medidas propostas para a mitigação da COVID-19, a adoção de um estilo de vida saudável, pautado por uma alimentação equilibrada e adequada, e atividade física/exercício físico, bem como, a perda ponderal de peso quando necessário, que podem ser fatores diferenciais num quadro de COVID-19 em ser ultrapassável ou fatal.
COVID-19 e Obesidade Infantil
As crianças obesas serão tendencialmente adultos obesos, implicando a redução da média da idade do aparecimento de doenças não transmissíveis, com repercussões no risco de desenvolver complicações pela COVID-19.
O encerramento das escolas pode exacerbar o risco de aumento de peso, semelhante ao relatado em vários estudos no período das férias de verão, tornando-se um desafio à prevenção de obesidade.
O elevado tempo em frente ao ecrã tem sido associado ao desenvolvimento de excesso de peso e obesidade em idade pediátrica, dado um maior consumo de snacks e exposição ao marketing de produtos ricos em açúcar, sal e gordura, aliado ao aumento do sedentarismo. Acresce que, as alterações de rotinas podem conduzir a um maior stress e a alterações nos padrões de sono, contribuindo para a preferência por “alimentos de conforto”.
Medidas de prevenção da obesidade Infantil
Perante o panorama atual, é crucial a adoção de medidas para prevenir o agravamento e aparecimento de obesidade infantil, em Portugal. Devem ser maximizadas as oportunidades para incorporar comportamentos saudáveis, como as refeições e a prática de atividade física.
Algumas sugestões:
- Organizar a ida ao supermercado, elaborando uma lista de compras, dando prioridade a hortofrutícolas e evitando adquirir alimentos/snacks com alto teor de açúcar, sal e gordura;
- Na cozinha, as crianças podem auxiliar na preparação das refeições, seguindo as normas de higiene e segurança alimentar, como a lavagem frequente das mãos e das bancadas, não misturar alimentos crus e cozinhados e lavar muito bem os vegetais e a fruta que deve ser consumida descascada;
- Manter os horários das refeições e ter em atenção as porções servidas;
- Fazer da fruta a sobremesa de excelência e inclui-la nas refeições intercalares. Porém, podem adicionar canela/hortelã e especiarias. Utilize-a e sirva-a em diferentes formas (espetadas, etc.);
- Incluir leguminosas (grão, feijão, ervilhas) em pelo menos algumas das principais refeições;
- Iniciar a refeição pela sopa, por forma a aumentar o consumo de hortícolas. A sopa para além de acrescentar valor nutricional à refeição regula o apetite;
- Água – incentivar o consumo de água e evitar as bebidas açucaradas;
- Promova 1-2 momentos (30 a 60 minutos) de atividade física por dia.
Perspetivas futuras
Muito existe, ainda, para descobrir e conhecer nesta/desta relação entre a obesidade e a COVID-19, mas certamente irá mudar a forma como iremos ver a obesidade no futuro, dado que, se perspetivam novas e sucessivas vagas infeciosas, transformando o trabalho dos profissionais de saúde, nomeadamente, dos nutricionistas e dos cidadãos, em prol da saúde, quer a nível de literacia/educação alimentar, quer a nível comportamental, face à alimentação/nutrição.
No contexto da pandemia da COVID-19, à medida que o conhecimento científico progride, a alimentação adequada e a necessidade de otimizar o estado nutricional têm vindo a ganhar ênfase. A alimentação e a nutrição são cruciais na prevenção desta doença e na intervenção, por forma a minimizar as consequências desta infeção viral.
Uma ingestão alimentar adequada permite a manutenção do sistema imunitário, a redução dos processos inflamatórios e o controlo metabólico, condições relevantes, para combater esta doença.
No presente, pela mão das escolhas alimentares tomemos o rumo consciencioso da saúde, da qualidade de vida, da qualidade alimentar/nutricional. Pensar no futuro distorce a comodidade do agora, das escolhas alimentares pelo conforto, pela gulosice, mas é o pensar que dá poder ao futuro, revertido em ganhos em saúde e anos de vida com qualidade. Que este tempo vivenciado seja um momento de ponderação/reflexão e Saúde.