Um conjunto de objetos e imagens nascidos com o 25 de Abril, pertencentes ao arquivo Ephemera, que espelham a pluralidade da vida política e a “alegria da liberdade”, abre ao público, em Lisboa, avança a Lusa.
Cartazes, emblemas, autocolantes, postais, faixas, cinzeiros, pratos, discos, objetos das mais diversas naturezas e dos mais diferentes partidos políticos, que ilustram a enorme diferença na paisagem visual pública surgida após o fim da ditadura compõem a exposição “Sinais da liberdade – Iconografia da democracia no arquivo Ephemera”, que fica aberta ao público até 28 de maio, no Tribunal da Boa Hora, em Lisboa.
A mostra integra-se nas comemorações do 25 de Abril do município de Lisboa e tem por objetivo divulgar o que foi a história da Revolução dos Cravos, a partir de objetos que marcaram a época.
“Não há praticamente legendas, porque a ideia era retratar um aspeto fundamental da liberdade” – “a alegria da liberdade” -, esclareceu o historiador José Pacheco Pereira, responsável pelo arquivo Ephemera, numa visita à imprensa antes da inauguração da mostra.
“Só quem não conheceu o período anterior ao 25 de Abril é que não percebe até que ponto esta paisagem infunde alegria, gosto de viver, de falar, de discutir, de divergir, que são no fundo características fundamentais da democracia”, afirmou.
Pacheco Pereira considera que esta é “também uma exposição contra a censura e contra as novas formas de censura, que vive da iconografia, imagens e objetos”, através da qual se tenta “retratar a variabilidade da ação política”.
Do conjunto de peças, José Pacheco Pereira realçou 10 objetos como “sendo os mais significativos, que não valem apenas por si, do ponto de vista estético, mas também do ponto de vista histórico”.
O primeiro é o cartaz de uma mulher sem pernas, integrado na série “Queremos responder” de uma campanha do CDS em 1976. Em expositores de vidro com várias peças, destacam-se o busto em bronze de Vasco Gonçalves, da autoria de Abílio Belo Marques (1926-2004), uma série de três cubos intermutáveis, datada de 1976/77, representando Mário Soares, Álvaro Cunhal, Isabel do Carmo e Arnaldo de Matos, assim como um galo de Barcelos cor de laranja, usado pelo candidato Fernando Reis, do PSD, na campanha por Barcelos, em 2009.
A “laranjinha” da JSD em esponja, dos anos 1990, uma pequena estátua em cerâmica de Álvaro Cunhal vestido de jogador do Futebol Clube do Porto e um copo com o emblema do Sporting, de 1974, quando este clube foi o primeiro campeão de futebol em liberdade, são outras das peças destacadas.
Uma das peças a que Pacheco Pereira deu mais destaque é uma caneca em cerâmica, que representa António Guterres nu “mostrando o ‘pau’” à oposição, com a inscrição “a oposição que se ponha a pau” na barriga.
“Tudo nesta caneca é um erro de ‘casting’, ser Guterres o representado, e ser representado como durão”, disse Pacheco Pereira.
No final da exposição, pode ver-se um ‘slideshow’ de cerca de 200 imagens de graffiti e pichagens de todo o país dos últimos anos.
Sobre a escolha do Tribunal da Boa Hora para esta exposição, Pacheco Pereira recordou que foi “um dos locais mais sinistros da ditadura, onde se faziam julgamentos de presos políticos que eram uma autêntica fantochada” e em que, muitas vezes, até os advogados eram presos.
O coordenador do projeto Ephemera adiantou ainda que no âmbito do protocolo com a Câmara Municipal de Lisboa, esta exposição é apenas parte da “grande exposição do 25 Abril” que terá lugar no próximo ano, com “iconografia, documentos, filmes, enorme quantidade de material, na maioria dos casos inéditos, tudo originais, e posteriormente incluindo documentos únicos sobre o 25 de Abril que, em alguns casos, nunca foram vistos”.
Depois da participação na mostra “Tesouros dos Arquivos do Barreiro”, que esteve na Gare Marítima de Alcântara, em Lisboa, até ao final de março, e além de “Sinais da liberdade”, em Lisboa, o Arquivo Ephemera tem mais oito exposições, patentes ou em fase de preparação, em todo o país, algumas em circulação.
Entre elas contam-se “Desculpe o Transtorno Estamos a Mudar o Pais!!”, com cartazes artesanais de protesto, no pavilhão multiusos de Argoncilhe, em Santa Maria da Feira; “AC | DC (Antes Covid| Depois Covid)”, na Biblioteca da Escola Superior de Tecnologia do Barreiro, e “A Face dos Livros”, na Biblioteca Eduardo Lourenço, na Guarda.
Viseu acolhe “Proibido por Inconveniente”, na Casa Amarela, edifício do Arquivo Distrital, e “Cartazes do 25 de Abril”, na Escola Secundária Alves Martins. Os cartazes também vão à Escola Superior de Artes Aplicadas do Politécnico de Castelo Branco. Odemira recebe “Livros Censurados”, no Espaço Criar.
“Movimento sindical e resistência operária nos últimos anos da ditadura”, com inauguração anunciada para maio, será repartida pela Manutenção Militar, em Lisboa, e pelas Oficinas da CP, no Barreiro.