As malformações de Chiari são uma condição em que a base do crânio é mais pequena e achatada na região onde este se liga à coluna vertebral, resultando na compressão do cerebelo – a parte inferior do cérebro – no canal espinal do pescoço. Esta compressão pode causar sintomas variados, incluindo dores de cabeça intensas, dores no pescoço, apneia do sono e dormência nos membros. Curiosamente, há pessoas com esta malformação que não apresentam quaisquer sintomas.
Segundo a revista New Scientist, estima-se que a forma mais leve da doença, a Chiari tipo 1, afete cerca de 1 em cada 100 pessoas. Apesar de relativamente comum, a origem desta condição sempre levantou questões.
Foi há cerca de 15 anos que o neurocirurgião brasileiro Yvens Barbosa Fernandes, da Universidade Estadual de Campinas, verificou que existe uma semelhança entre a forma da base do crânio dos seus doentes com Chiari e a dos Neandertais, uma espécie humana extinta. Destacou, especificamente, a ligeira inclinação do osso occipital, a zona do crânio onde assenta o cerebelo. Em 2013, publicou a hipótese de que esta característica poderia ser uma herança genética deixada pelos cruzamentos entre Homo sapiens e Neandertais.
Inspirados por esta ideia, investigadores da Universidade das Filipinas, em Quezon City, realizaram um estudo que envolveu a criação de modelos digitais em 3D de crânios de 46 pessoas com Chiari tipo 1 e 57 sem a malformação, a partir das suas tomografias computorizadas. As análises matemáticas confirmaram que os crânios das pessoas com Chiari tinham o osso occipital mais pequeno, com um ângulo mais plano, e apresentavam maior compressão do cerebelo na base do crânio.
De seguida, a equipa comparou estes modelos digitais com fósseis de oito crânios de várias espécies humanas extintas, nomeadamente Homo neanderthalensis, Homo erectus, Homo heidelbergensis e Homo sapiens antigo. A comparação revelou que as bases do crânio dos Neandertais tinham medidas e formas muito próximas às dos humanos modernos com Chiari. Por outro lado, as bases cranianas das outras espécies fósseis assemelhavam-se mais às dos humanos modernos sem a malformação.
Este estudo sugere que a malformação de Chiari tipo 1 pode ser uma característica herdada da ancestralidade Neandertal, explicando assim a sua presença em muitos indivíduos e a frequência relativamente elevada da condição. Além disso, o reconhecimento da ligação genética pode ajudar no diagnóstico e desenvolvimento de tratamentos mais direcionados.
A descoberta abre ainda portas para um melhor entendimento das relações evolutivas entre os humanos modernos e os Neandertais, assim como dos impactos das suas misturas genéticas na nossa saúde atual.