O insuportável Jean-Claude Dusse dos filmes “Barracas na Praia” (“Les bronzés”, 1978, 1979 e 2006), grande ator do cinema cómico dos anos 1980 antes de seguir para papéis dramáticos e uma carreira como realizador, Michel Blanc morreu aos 72 anos, na noite de quinta para sexta-feira.
Anunciada pela revista Paris Match, a sua morte foi confirmada à France-Presse (AFP) pelo assessor de imprensa dos seus principais filmes, Laurent Renard.
O ator sofreu um ataque cardíaco à noite e foi transportado em estado grave para um hospital parisiense, esclareceu o seu representante.
“Bolas, Michel… O que fizeste connosco…”, reagiu no Instagram o ator Gérard Jugnot, o seu cúmplice do grupo de comédia Splendid, resumindo o espanto e a emoção do público francês ao anúncio do falecimento.
“Michel, meu amigo, meu irmão, meu parceiro”, escreveu na mesma rede social a atriz Josiane Balasko, também parte do grupo que lhes deu a fama.
“Esta manhã, a dor é imensa, proporcional ao seu talento (…). O cinema, o mundo da cultura e todos os franceses não o esquecerão”, afirmou a ministra da Cultura, Rachida Dati, na rede social X (antigo Twitter).
As imagens de Jean-Claude Dusse em “Barracas na Praia” (1978), de Patrice Leconte (1978), ou de Denis em “Vai Pela Sombra” (1984), que dirigiu, são as personagens cómicas de perdedores exasperantes que lhe renderam imensa popularidade entre o público.
Arquétipo
“Barracas na Praia”
Nestes filmes, Michel Blanc criou um arquétipo cómico, o do homem magro e de bigode, careca, tão exasperante quanto cativante, que se lhe colou à pele.
“Na época, escrevemos personagens que eram bem próximos de nós. Jean-Claude Dusse era claramente para mim, não para Thierry Lhermitte [o playboy de “Barracas na Praia”]. Rapidamente fiquei com medo de ficar associado a isso durante toda a minha vida”, disse o ator à Paris Match numa entrevista na primavera.
Seguiu então por outros caminhos, com papéis dramáticos como o do travesti Antoine em “Traje de Noite” (1986), de Bertrand Blier, ao lado de Gérard Depardieu, que lhe valeu o prémio de Melhor Ator no Festival de Cannes (‘Ex aequo’ com Bob Hoskins por “Mona Lisa”), ou o perturbador “Monsieur Hire” (1989), de Patrice Leconte, baseado num livro de Georges Simenon, que o consagrou com o César de Melhor Ator (o “Óscar francês”).
“Monsieur Hire”
“Com a sua morte celebraremos o ator de “Barracas na Praia” e outros sucessos públicos […], mas esperemos que não esqueçamos um filme em que ele é ator e realizador, e o ‘Monsieur Hire’, que é uma obra-prima”, reagiu o ex-presidente do Festival de Cannes, Gilles Jacob, no X.
“Os Livros de Próspero” (1991), de Peter Greenaway, e “O Monstro” (1994), de Roberto Benigni, foram outros filmes desta fase da carreira.
Trabalhador, perfeccionista, Michel Blanc soube usar os seus complexos e o seu talento de argumentista para explorar o desencanto e moldar as personagens dos seus filmes, notavelmente aqueles que dirigiu, como “Grosse Fatigue” (1994), com o qual ganhou outro prémio em Cannes, o de Melhor Argumento, e “Amor Sem Tréguas” (2002).
“Grosse Fatigue”
Em 2006, Patrice Leconte reuniu novamente o grupo de atores de “Barracas na Praia” para um terceiro filme, que foi um fracasso crítico.
Apesar disso, Michel Blanc ainda queria trabalhar novamente com os seus antigos cúmplices do Splendid, como disse na primavera ao Paris Match.
“Fazer coisas juntos, sim, mas não ‘Barracas na Praia’. Já não sabemos fazer esse humor. Já se passaram quase 50 anos, o mundo evoluiu”, comentava.
Com outro papel dramático em “L’exercice de l’État” (2011) ganhou um segundo César, como ator secundário.
“L’exercice de l’État”
“Uma Pequena Zona de Turbulência” (2009), “As Recordações” (2015), “Raid – Pelotão Chanfrado” (2016) e “Doutor?” (2019) foram filmes recentes que estrearam em Portugal.
Um dos seus últimos filmes, “Pequenas Grandes Vitórias” (2023), ainda está em exibição num cinema de Lisboa.