«As pensões de Jardim Gonçalves, Cavaco Silva, Vítor Constâncio e Ricardo Salgado causaram indignação nas redes sociais, em abril passado. O valor que cada um recebia – alguns milhares de euros por mês – contrastava com a pensão de 267 euros mensais atribuída ao bombeiro Rui Rosinha, com 85% de incapacidade», refere a DecoProteste.
O Polígrafo confirmou, na altura, que o ex-presidente do Banco BCP recebia (em 2019) 167 mil euros por mês, um terço dos quais pago pelo fundo de pensões do banco. O antigo presidente da República auferia, quando assumiu a presidência em 2011, cerca de 10 mil euros, valor que preferiu receber em vez do vencimento. Todavia, em 2019, esse valor, de acordo com o Polígrafo, podia já superar os 11 mil euros. Quanto ao ex-governador do Banco de Portugal, acumulava (também em 2019) pensões no valor de 27 mil euros, e o antigo responsável do Banco Espírito Santo recebia 39 mil euros, entretanto parcialmente penhorados devido a problemas com a justiça.
Estes antigos responsáveis pertencem a uma pequena minoria de portugueses (3,5%) que tem direito a pensões acima de 2600 euros por mês. Com efeito, segundo um inquérito divulgado, em maio, pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), aproximadamente 70% dos portugueses recebem reformas abaixo de 1000 euros mensais (dados de 2023).
Destes, a maioria tem pensões que não ultrapassam os 600 euros (cerca de 35% dos homens recebe entre 301 e 600 euros, e 56,3%, no caso das mulheres; 30,6% entre 601 e 1000 euros). Não surpreende que 13,2% dos pensionistas tenham optado por continuar a trabalhar quando receberam a primeira pensão. Razões financeiras é a principal justificação apontada.
Também a maioria dos pensionistas por invalidez recebe entre 301 e 600 euros por mês. Um quarto tem direito a menos de 300 euros por mês. Uma vez mais, “as mulheres são relativamente mais afetadas por pensões de baixo valor do que os homens”, salienta o inquérito do INE. A idade média destes pensionistas é de 49 anos.
Pensões pagas pelo Estado
O sistema português está dividido em três: sistema de previdência; sistema de proteção social; e sistema complementar.
O sistema de previdência é financiado pelas contribuições dos trabalhadores, sendo responsável pelo pagamento das pensões de velhice, de sobrevivência e de invalidez.
Segundo os últimos dados do INE, em 2023, a Segurança Social tinha a seu cargo 3 020 960 pensionistas no total. Este número inclui beneficiários da pensão de velhice, de invalidez e de sobrevivência. No início do milénio, o número não atingia os dois milhões e meio. Em comparação a 1960, a discrepância é abismal (no início da década de 60 havia cerca de 120 mil pensionistas). Há uma razão. Embora as primeiras pensões de velhice e de invalidez tenham surgido na década de 30 do século XX, apenas no início dos anos 60 o regime de proteção social foi alargado aos trabalhadores da indústria, comércio e serviços.
As pensões de sobrevivência aumentaram, mas a um ritmo mais lento, passando de quase 599 mil, em 2000, para 741 mil, no ano passado. Neste mesmo período, as pensões por invalidez caíram de cerca de 370 mil para menos de 163 mil. Mais homens do que mulheres, ao contrário do início do milénio, em que predominava o sexo feminino. Porto, Lisboa e Braga são os concelhos com o maior número de pensões por invalidez. Regras mais apertadas introduzidas em 2015 justificam esta queda.
Para este sistema de previdência, contribuem 4,2 milhões de trabalhadores. Ou seja, há menos de duas pessoas a descontarem por cada pensionista, o que dificulta a sustentabilidade da Segurança Social.
No que respeita ao sistema de proteção social, é custeado pelos impostos. É responsável pelo pagamento, por exemplo, do complemento solidário para idosos. O Estado tem a seu cargo 134 mil pensões sociais e 157 mil complementos solidários para idosos.
Por sua vez, o sistema complementar compreende um regime público de capitalização (Certificados de reforma, conhecidos como “PPR do Estado) e regimes complementares de iniciativa coletiva e individual, como é o caso dos fundos de pensões constituídos por empresas para benefício dos seus trabalhadores.
Incentivar a poupança a médio e longo prazo, através de esquemas complementares de reforma, no plano das empresas e das pessoas é um dos objetivos do atual Governo. O aumento da esperança de vida e a baixa natalidade “colocam sérios desafios ao sistema de pensões”, reconhece.
As pensões de velhice absorvem a maior fatia do orçamento da Segurança Social. Segundo o INE, em 2023, a quase totalidade dos pensionistas de velhice (98%) recebia uma reforma paga por um regime público (nacional ou estrangeiro), isto é, paga pelo Estado.
De acordo com o Instituto de Gestão da Segurança Social, estão previstos quase 16 mil milhões de euros para o pagamento de reformas este ano. Seguem-se as pensões de sobrevivência (3 mil milhões), e as de invalidez (quase 1,3 mil milhões). Os antigos combatentes receberão 53 milhões.
Há ainda uma fatia de 976 milhões para atualização extraordinária de pensões, e 600 mil euros para o complemento excecional de pensão. Tudo somado, a Segurança Social deverá gastar 22,118 mil milhões de euros em 2024. No início do milénio, este valor era de 7 mil milhões.
Pensões com penalização
Uma percentagem significativa de portugueses (38,5%) reforma-se antes de atingir a idade legal da reforma (66 anos e 4 meses, em 2024, e 66 anos e 7 meses, em 2025), segundo o inquérito do INE já citado. Ou seja, deixam de trabalhar antes de terem direito à pensão na sua totalidade, sofrendo, por isso, uma penalização, que reduz o valor da pensão. É o caso do fator de sustentabilidade, que passou de 13,83%, em 2023, para 15,8% este ano, com o objetivo de dissuadir os portugueses a reformarem-se mais cedo.
Há vários mecanismos que permitem a reforma antecipada. Contudo, a Comissão para a Sustentabilidade da Segurança Social, criada pelo anterior Governo, defende que a lei deve ser alterada, para impedir que um número tão elevado tenha acesso à pensão de velhice antes do tempo legal. Com efeito, o livro verde defende o seguinte:
- Aumentar a idade de acesso às várias modalidades de reforma antecipada de modo a ficar mais próxima da idade legal (66 anos e 4 meses, em 2024).
Ou seja, a comissão propõe o acesso à pensão cinco anos antes (61 anos e 4 meses) e não a partir dos 60 anos, como está previsto, neste momento, para quem tem 40 ou mais anos de contribuições e no caso das denominadas carreiras longas; - Eliminar o regime de reforma antecipada para quem esgota o subsídio de desemprego aos 57 anos.
- Atualmente, quem ficar desempregado aos 52 ou mais anos de idade e tem, pelo menos, 22 anos de registo de remunerações, beneficia de reforma antecipada a partir dos 57 anos. Sofre, no entanto, uma penalização de 0,5% por cada mês de antecipação em relação aos 62 anos. Devido ao número elevado de pessoas que se reforma por esta via – 48,4% das reformas antecipadas, em 2022 -, a comissão propõe acabar com este regime. “Será cada vez maior o incentivo para que o empregador e/ou o trabalhador recorram a rescisão do contrato de trabalho com vista à antecipação da reforma, muitas vezes com grave prejuízo ao nível do rendimento pós-reforma”, argumentam.
- Ajustar a idade de acesso à reforma antecipada para quem fica desempregado aos 57 anos e, esgotado o prazo do subsídio de desemprego, não consegue regressar ao mercado de trabalho. Isto é, a comissão propõe que o acesso à reforma antecipada nestes casos seja aos 63 anos e 4 meses e não aos 62 anos sem penalização, como estipula, atualmente, a lei.
Reformas vão cair para menos de metade, em 2050
Segundo o Ageing Report 2024, da Comissão Europeia, quem se reformar em 2050 receberá de pensão 38,5% do último salário, isto é, menos de metade do que a Segurança Social paga atualmente. Um cenário preocupante, se tivermos em conta que a maioria dos portugueses que respondeu ao inquérito do INE (78%) admitiu não ter qualquer plano B. Quando deixarem a vida ativa, estão confiantes que terão direito à pensão da Segurança Social ou da Caixa Geral de Aposentações. Apenas 13,5% esperam receber uma combinação de uma destas pensões com uma pensão profissional e/ou individual.