“Estima-se que cerca de 100 pessoas são diagnosticadas com encefalite autoimune todos os anos em Portugal, embora a realidade portuguesa não esteja ainda bem estudada”, afirma Ester Coutinho, coordenadora do Grupo de Estudos em Neuroimunologia e Encefalites (GENIE).
Como acrescenta: “Estas doenças são muito graves, podendo levar a incapacidade significativa ou à morte, mas um desfecho menos favorável pode ser prevenido com diagnóstico e tratamento atempado”, acrescenta.
Face a esta possibilidade de diagnosticar atempadamente as encefalites autoimunes e evitar o pior prognóstico, foi criado o GENIE, que foi oficialmente apresentado no passado dia 24 de janeiro, em Coimbra. “O objetivo principal do GENIE é disseminar informação sobre estas doenças que só recentemente foram reconhecidas e, portanto, são ainda desconhecidas por grande parte da população e mesmo por alguns profissionais de saúde e investigadores que, eventualmente, podem estar interessados a trabalhar nesta área”, afirma a também investigadora do Centro de Neurociências e Biologia Celular da UC (CNC-UC) e do Centro de Inovação em Biomedicina e Biotecnologia (CiBB).
A encefalite, uma inflamação do tecido cerebral, pode ter várias causas: infeciosa, inflamatória (na presença ou não de outras doenças autoimunes, como lúpus) e em associação a tumores noutros órgãos. “A encefalite autoimune decorre da reação do sistema imune contra proteínas que fazem parte da superfície ou do interior dos neurónios. Esse ataque do sistema imune é maioritariamente feito através de autoanticorpos ou células T autorreativas.”
Existem várias encefalites de causa autoimune. De acordo com a responsável, distinguem-se dois tipos principais: encefalites autoimunes causadas por anticorpos contra antigénios membranares (ex. CASPR2, LGI1, NMDAr, GAD65, entre outros); e encefalites paraneoplásicas clássicas, que são associadas a anticorpos contra antigénios intracelulares (ex. anti-Hu, -CV2/CRMP5, -Ma2, -anfifisina).
Na maioria dos doentes não se sabe o que causa esta reação anómala do sistema imune, mas em alguns casos parece associar-se à presença de um tumor noutros órgãos do corpo (encefalites paraneoplásicas), a uma infeção prévia ou, muito raramente, a alguns fármacos que têm efeito no sistema imune.
A encefalite autoimune pode afetar pessoas de todas as idades, desde crianças até idosos, mas nem sempre se consegue identificar o anticorpo envolvido. Os doentes com encefalites autoimunes podem apresentar-se com diversos sintomas neurológicos e psiquiátricos, apresentando-se como um quadro progressivo ao longo de dias ou semanas.
Alguns sintomas de encefalite autoimune incluem: perda de memória a curto prazo, alteração do estado mental ou outros défices cognitivos; sintomas psiquiátricos como psicose, alteração do comportamento, agressão, euforia, ataques de pânico; défices focais do sistema nervoso central, como falta de força e alterações da fala; crises epiléticas; e outros sintomas neurológicos (movimentos anormais, problemas com o equilíbrio e visão).
O tratamento precoce diminui a probabilidade de sequelas a longo prazo, acelera a recuperação e reduz o risco de recorrência. Se não tratada, a encefalite autoimune pode evoluir com deterioração neurológica progressiva. As lesões já instaladas, aquando da apresentação da doença, podem resultar em algumas sequelas como defeito cognitivo, epilepsia, dificuldades na fala ou défices sensitivo-motores e condicionar algum grau de dependência nas atividades de vida diária.
A associação foi criada por investigadores da Universidade de Coimbra, que está a aceitar novos membros, sendo a inscrição feita através do website encefalites.pt.